A Economia, o Direito e a Crise Econômica

A economia e o direito devem sempre caminhar juntos, para o melhor desenvolvimento econômico do País.

A segurança jurídica assegura a continuidade das empresas que já estão gerando emprego, renda e pagando tributos, assim como atrai novos empreendedores nacionais e estrangeiros que são os responsáveis pelo desenvolvimento econômico.

Contudo, não é isso que se vê no Brasil de hoje. Ao contrário, a cada dia, os resultados das demandas judiciais surpreendem os Juristas mais experientes em razão do grau de afastamento das leis vigentes, da jurisprudência e da doutrina.

No Brasil, nossos juízes são Treinados para focar os litígios em sua individualidade. Não vislumbra o Juiz os efeitos de sua decisão na ordem econômica e no consequente desenvolvimento econômico.

A atual imprevisibilidade e a falta de critério na fundamentação dos julgados que justifique o distanciamento do comando da lei e da jurisprudência dominante geram insegurança jurídica. Os empresários ficam sem saber quais as regras de comércio, trabalhista, tributária e cível vão prevalecer e isso pode gerar grande instabilidade econômica.

As diversas formas de entendimento para o mesmo fato, que ocorrem diariamente nas Varas, Turmas e Câmaras da Justiça Brasileira e, muitas vezes, dentro da mesma Turma ou Câmara dependendo da composição da Turma Julgadora, demonstram que, por vezes, o que prevalece são as convicções pessoais do julgador em detrimento do comando legal ou mesmo da Jurisprudência dominante. Isso, muitas vezes, em nome da primazia da realidade sobre a forma ou da lógica do razoável  por exemplo,   não obstante o nosso código de processo civil ter primado em priorizar o precedente como forma de preservação da segurança e estabilidade jurídica.

A segurança jurídica é temporal; para o passado se tem a garantia de que nunca será objeto da deliberação proposta de emenda tendente a abolir: o direito adquirido, ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Para o presente, tem-se a garantia da eficácia normativa das regras jurídicas positivadas (legislação) que são publicadas para o conhecimento de todos (efeitos erga omnes) e para o futuro temos a garantia da irretroatividade e da anterioridade da lei, sendo que  este último é a possibilidade de se conhecer com antecedência o conteúdo da nova regra.

Desta forma, a falta de previsibilidade da decisão judicial traz a incerteza, intranquilidade e falta de confiança de que os atos praticados estão de acordo com ordem jurídica vigente, visto que o dever jurídico baseia-se exclusivamente na ordem jurídica em vigor que o impõe e que foi prescrita pela ordem social.

Essa falta de previsibilidade das decisões judiciais impede o empresário de conduzir e planejar suas relações jurídicas, pois os riscos empresariais assumidos estão alicerçados na previsibilidade e calculabilidade dos efeitos jurídicos dos direitos e obrigações assumidas.

Em última análise, concordamos com o Ministro do STJ José Augusto Delgado[1] quando ressalta que a Segurança Jurídica representa a confiabilidade no sistema legal aplicado, na inexistência de julgamentos parciais e da não mudança injustificada da jurisprudência dominante sobre determinado tema.

Assumir riscos empresariais não significa mergulhar em um abismo de incertezas e rumo ao completo desconhecido. Ao contrário, significa assumir riscos ordinários, comuns, previsíveis, oriundos de relações jurídicas as quais os empresários farão no comando da sua empresa, pois ele antes de abrir seu fundo de comércio, irá fazer a análise da legislação, civil, comercial, trabalhista, tributária, ambiental etc, da sua área se atuação.

Após esse levantamento, deverá verificar também como os Tribunais vêm decidindo a respeito das demandas afetas ao seu ramo de negócio, os valores das condenações e o grau de possibilidade de sair vencedor nessas demandas, de forma a contingenciar esses valores e, também, agir de forma preventiva para evitar ou extinguir litígios com grande possibilidade de perda. Após essas análises ele dosa o risco jurídico do empreendimento para fazer parte de sua planilha financeira e consequentemente do business plan.

A sentença judicial não pode ser uma surpresa para as empresas, apenas para os empresários menos avisados ou menos cautelosos, pois os riscos das ações em curso e suas consequências financeiras devem ser conhecidos, por óbvio, levando-se em consideração a previsibilidade das decisões judiciais, pois não raro se vê casos de sentenças que levaram empresas à quebra, seja pela falta de experiência administrativa do empresário ou pela imprevisibilidade da decisão ou do valor desarrasoado da condenação.

A falta de previsibilidade das decisões judiciais faz com que os empresários assumam riscos extraordinários, ocultos, obscuros, imprevisíveis e incalculáveis e, neste caso, não há como traçar estratégias para mitigar os riscos que poderão ser decisivos na viabilidade do empreendimento, mormente se este for a longo prazo.

O Ministro do STF Gilmar Mendes[2] é preciso quando alega que diante da imprevisibilidade natural, ínsita a negócios de maior ou menor risco, a segurança das regras do jogo é garantia fundamental para aqueles que investem seu capital em diferentes empreendimentos.

Para os empresários que irão transacionar com a administração pública, a situação é ainda pior, pois o princípio da confiança legítima que deveria orientar a relação jurídica entre estado e particular, que em síntese significa que os atos administrativos devem se prolongar no tempo de forma a gerar no administrado uma expectativa de continuidade, necessária a estabilização das relações entre administração e os administrados, também não vem sendo obedecido.

Com essa falta de comunicação entre direito e economia, os empresários não investem em países que não tenham estabilidade e previsibilidade nas decisões judiciais, preferindo levar seu capital para países nos quais essas condições já estejam acomodadas.

Ulhôa Coelho[3] com mestria sintetiza que se o grau de imprevisibilidade das decisões judiciais num certo país é mais acentuado que em outro, este último aparecerá como alternativa mais interessante para o investimento. A estabilidade do marco institucional é fator de atração de investimentos sadios. Se for considerável o risco de a norma regente do investimento não ser aplicada pelos Tribunais ou receber neles uma nova interpretação, o investidor não terá o retorno estimado e tenderá a redirecionar suas opções para outros países, em que tais distorções sejam menos frequentes.

A imprevisibilidade das decisões judiciais nos níveis hoje atingidos, mormente em matérias como redirecionamento das execuções fiscais e trabalhistas, revisão de contratos, formação de grupos econômicos, desconsideração da personalidade jurídica ordinária e inversa, improbidade administrativa em razão de contratos com o setor público, gize-se, daqueles que são bons empresários, podem estar contribuindo para o desequilíbrio da economia e a queda no PIB em razão do crescimento da quebra de empresas e da falta de novos investimentos. Nota-se que o Judiciário não dá tratamento desigual ao empresário que pode ter passado por problemas financeiros em razão de um insucesso profissional ou crise no seu mercado de atuação, do empresário leviano, fraudador,  ou de má – fé, pois basta ser devedor que a medida do golpe da espada é mesmo.

Porquanto, cabe exclusivamente ao Poder Judiciário evitar a imprevisibilidade das suas decisões  e  orientar seus juízes que o foco dos efeitos de suas decisões não é individual e sim o coletivo, visando o desenvolvimento econômico do país e o consequente bem estar social.

Por Luciano Argão
Mestre em Direito das Relações Econômicas
Professor da Graduação e Pós Graduação em Direito
Advogado, Sócio da Aragão Advogados.

 

[1] In Imprevisibilidade das decisões Judiciárias e seus reflexos na segurança jurídica.

[2] A Reforma do Sistema Judiciário no Brasil: Elemento Fundamental para Garantir Segurança Jurídica ao Investimento Estrangeiro. In: Doutrinas Essenciais, Direito Empresarial.Volume VIII. Arnoldo Wald (org). São Paulo. RT, 2011.p.771.

[3] IN “ A JUSTIÇA DESEQUILIBRANDO A ECONOMIA” artigo publicado no Valor Econômico de 10.11.2006.

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