Principais Notícias do Mês – Janeiro de 2024

SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ)

02/01/2024

Ação de cobrança de indenização securitária exige prévio requerimento administrativo

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou o entendimento de que, para a configuração do interesse jurídico na propositura de ação de cobrança de indenização securitária, é necessário o prévio requerimento administrativo.

Com esse fundamento, o colegiado negou provimento ao recurso especial interposto por uma segurada para que pudesse prosseguir em primeira instância a ação na qual pedia o pagamento de indenização de seguro de vida contratado por sua ex-empregadora, em razão de alegada incapacidade para o desempenho da função que exercia na empresa.

Em primeiro grau, o processo foi extinto diante da falta de comprovação de prévio requerimento administrativo para o pagamento da indenização. A sentença foi mantida pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT).

Para a relatora do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, a inexistência de prévia comunicação do sinistro à seguradora, a fim de viabilizar o pagamento extrajudicial da indenização, impede o regular exercício do direito de ação. “Uma vez que a seguradora não tomou conhecimento acerca da concretização do interesse segurado, não há lesão ou ameaça de lesão a direito, circunstância que conduz à ausência de interesse processual“, disse.

Aviso de sinistro formaliza o pedido de pagamento da indenização

A ministra citou o artigo 771 do Código Civil, que estabelece que, “sob pena de perder o direito à indenização, o segurado participará o sinistro ao segurador, logo que o saiba, e tomará as providências imediatas para minorar-lhe as consequências”.

“O aviso de sinistro representa a formalização do pedido de pagamento da indenização securitária. Antes disso, a seguradora não está obrigada a pagar, simplesmente porque não tem ciência do evento. Em outras palavras, antes de o beneficiário ou segurado informar a seguradora acerca da ocorrência do sinistro e do transcurso de prazo hábil para a sua manifestação, não há lesão a direito ou interesse do segurado”, observou.

Segundo a relatora, por não haver forma específica exigida em lei, o segurado ou beneficiário pode fazer o aviso por telefone, e-mail, carta ou qualquer outro meio de comunicação colocado à sua disposição pela seguradora.

Nancy Andrighi ressaltou que o interesse de agir não se resume à utilidade do provimento judicial pretendido, mas também exige que essa tutela seja necessária à solução do conflito. Ela esclareceu que só o dano ou a ameaça de dano jurídico, representado pela efetiva existência de uma pretensão resistida, é que autoriza o exercício do direito de ação.

Resistência da seguradora evidencia a presença do interesse processual

A relatora destacou que, excepcionalmente, a ausência de requerimento administrativo prévio pode não impedir o prosseguimento do processo, desde que tenha sido feita a citação da seguradora. Se, nessa hipótese, a seguradora se opuser ao pedido de indenização, ficará clara a sua resistência à pretensão do segurado, evidenciando a presença do interesse de agir.

“Porém, nem sempre a resposta da seguradora implicará impugnação ao pedido de pagamento. É possível, por exemplo, que ela invoque a ausência de prévia solicitação administrativa, hipótese em que caberá a extinção do processo sem resolução do mérito, por ausência de interesse processual“, afirmou.

Leia o acórdão no REsp 2.059.502.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 2059502
03/01/2024

Justiça estadual é competente para julgar ação de cobrança de empreiteiro contra contratante

Ao analisar conflito de competência, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou a jurisprudência segundo a qual cabe à Justiça comum estadual processar e julgar ação ajuizada por empreiteiro contra o contratante de seus serviços.

O conflito foi suscitado pela Justiça do Trabalho em São Paulo, após o juízo estadual declinar da competência para julgar a ação de cobrança com pedido de danos morais em que um empreiteiro pede o pagamento da reforma realizada, para a qual ele contratou outros prestadores.

Para o juízo trabalhista, a natureza dos pedidos é civil, pois o autor da ação não foi empregado do contratante e não há discussão sobre eventual relação de emprego entre as partes, nem pedido de verbas trabalhistas.

Modalidade contratual empreitada não tem relação de subordinação entre as partes

O relator no STJ, ministro Marco Buzzi, explicou que a empreitada, conforme previsto nos artigos 610 a 626 do Código Civil, configura-se quando uma parte (empreiteiro) se obriga, sem subordinação, a executar determinada obra em favor da outra parte (proprietário, comitente), em troca do pagamento acertado.

“A referida modalidade contratual constitui obrigação de resultado, na qual, ao empreiteiro, mediante a devida remuneração e sem relação de subordinação, impõe-se a entrega da obra contratada, seguindo as orientações/instruções gerais do dono da obra”, disse.

Segundo o ministro, no caso em julgamento, o autor da ação contratou outros prestadores de serviços para atuarem na execução da obra, sendo o empreiteiro o responsável pela remuneração desses trabalhadores. Ao citar diversos precedentes do tribunal, o relator destacou que, nessa hipótese, sobressai a natureza de contrato de empreitada, sendo da Justiça comum a competência para processar e julgar a respectiva ação de cobrança.

Em seu voto, o ministro considerou ainda que o juízo trabalhista analisou todas as peculiaridades do contrato em questão, bem como a dinâmica dos fatos narrados no processo, para concluir que não ficou demonstrado o caráter pessoal necessário para a caracterização da relação de emprego entre o tomador do serviço e o empreiteiro.

Leia o acórdão no CC 197.329.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):CC 197329
05/01/2024

Terceira Turma assegura gratuidade de justiça a criança em ação que discute pensão alimentícia de R$ 10 mil

Em ação sobre alimentos, a concessão da gratuidade de justiça para a criança ou o adolescente não está condicionada à demonstração de insuficiência de recursos de seu representante legal. Ao reafirmar esse entendimento, em decisão unânime, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento ao recurso de uma menina – representada por sua mãe – em processo que discute a revisão de pensão alimentícia fixada em torno de R$ 10 mil.

“É evidente que, em se tratando de crianças ou adolescentes representados pelos seus pais, haverá sempre um forte vínculo entre a situação desses dois diferentes sujeitos de direitos e obrigações, sobretudo em razão da incapacidade civil e econômica da própria criança ou do adolescente, o que não significa dizer que se deva automaticamente examinar o direito à gratuidade a que poderiam fazer jus à luz da situação financeira de seus pais”, observou a relatora, ministra Nancy Andrighi.

Em apoio a esse entendimento, ela invocou dois precedentes da Terceira Turma, ambos em segredo de justiça: um que também tratava de alimentos, julgado de forma unânime, e outro em processo de reparação de danos morais, no qual o colegiado, por maioria, assegurou a justiça gratuita ao autor menor de idade.

Alegação de insuficiência tem presunção de veracidade

Um homem ajuizou ação revisional na tentativa de reduzir a pensão de cerca de R$ 10 mil fixada em favor da filha. Citada, a filha apresentou reconvenção, pedindo o aumento da pensão para R$ 30 mil. O juízo de primeiro grau indeferiu o benefício da gratuidade pleiteado pela criança.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve a decisão, entendendo que o padrão de vida da criança era incompatível com a gratuidade e que eventual dificuldade financeira momentânea deveria ser demonstrada por ela.

A relatora no STJ destacou que, de acordo com o artigo 99, parágrafo 6º, do Código de Processo Civil (CPC), o direito à gratuidade de justiça é pessoal, não se estendendo a litisconsorte ou a sucessor do beneficiário. Segundo a ministra, é com base nessa natureza personalíssima que se entende que os pressupostos legais para a concessão da gratuidade deverão ser preenchidos, em regra, pela própria parte, e não pelo seu representante.

Nancy Andrighi também ponderou que, conforme o parágrafo 3º do artigo 99 do CPC, a alegação de insuficiência financeira pela pessoa natural tem presunção de veracidade, que só poderá ser afastada se houver evidências de que a declaração é falsa (artigo 99, parágrafo 2º, do CPC).

Não pode haver restrição injustificada à ação de revisão da obrigação alimentar

Para a ministra, nos pedidos de gratuidade feitos por criança ou adolescente, é apropriado que, inicialmente, seja deferido o benefício em razão da presunção de veracidade, ressalvada a possibilidade de a parte contrária demonstrar, posteriormente, a ausência dos pressupostos legais do benefício.

“Essa forma de encadeamento dos atos processuais privilegia, a um só tempo, o princípio da inafastabilidade da jurisdição, pois não impede o imediato ajuizamento da ação e a prática de atos processuais eventualmente indispensáveis à tutela do direito vindicado, e também o princípio do contraditório, pois permite ao réu que produza prova, ainda que indiciária, de que não se trata de hipótese de concessão do benefício”, declarou.

A relatora ainda ressaltou que deve ser levada em consideração a natureza do direito material em discussão, acrescentando que não pode existir restrição injustificada ao exercício do direito de ação quando se trata de fixação, arbitramento, revisão ou pagamento de obrigação alimentar.

“O fato de a representante legal do beneficiário possuir atividade remunerada e o elevado valor da obrigação alimentar que é objeto da execução não podem, por si só, servir de impedimento à concessão da gratuidade de justiça às crianças ou aos adolescentes que são os credores dos alimentos, em favor de quem devem ser revertidas as prestações com finalidades bastante específicas e relevantes”, concluiu a ministra.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2024/05012024-Terceira-Turma-assegura-gratuidade-de-justica-a-crianca-em-acao-que-discute-pensao-alimenticia-de-R–10-mil.aspx

12/01/2024

Cobrança de cota por tratamento ambulatorial não é abusiva

O tratamento feito por meio do método Pediasuit é uma modalidade ambulatorial. Assim, desde que a cobrança esteja prevista no contrato, o plano de saúde não age de forma abusiva ao exigir que o paciente pague cota de coparticipação para receber o procedimento.

Esse foi o entendimento adotado pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, para reformar uma decisão que considerou indevida a cobrança, por uma operadora de saúde, de um valor adicional por um tratamento do protocolo Pediasuit fornecido a uma paciente menor de idade.

Portadora de paralisia cerebral, epilepsia, hidrocefalia e cisto cerebral, a menina precisou ser submetida a uma terapia de reabilitação neuropsicomotora aplicada por meio do protocolo — que consiste no uso de uma vestimenta ortopédica para exercitar a musculatura, aliado a fonoaudiologia e terapia ocupacional.

Para custear o tratamento, porém, o plano exigiu que a família da criança pagasse uma cota de coparticipação pelo Pediasuit. Inconformado, o pai da menina entrou com ação de revisão de contrato e de compensação por dano moral. No pedido, ele sustentou que a cobrança era abusiva, mas o juízo de primeiro grau rejeitou a ação. O homem recorreu, e o Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT) acolheu parcialmente o pleito.

Na decisão, a corte estadual reconheceu que a cobrança de coparticipação não é ilegal. Por outro lado, o tribunal entendeu que, por falta de previsão no contrato, o plano não poderia cobrar por um tratamento que não se enquadra na modalidade ambulatorial. A operadora, então, levou o caso ao STJ.

Em recurso especial, a empresa argumentou que terapias como a do método Pediasuit são aplicadas em clínicas ou consultórios, sem necessidade de internação, o que permite classificá-las como ambulatoriais. Além disso, a instituição argumentou que a Lei 9.656/98, que regula os planos de saúde, regulamentou as cotas de coparticipação. Dessa forma, não há abusividade ou ilegalidade em cobranças do tipo — que envolvem pagamento de taxa referente ao atendimento ambulatorial e que são necessárias para que a empresa custeie as sessões sem colocar em risco seu equilíbrio financeiro.

Aspectos legal e ambulatorial
Relatora do caso, a ministra Nancy Andrighi deu razão à empresa. Segundo ela, o STJ já firmou entendimento de que não há ilegalidade na contratação de plano de saúde em regime de coparticipação, “seja em percentual sobre o custo do tratamento, seja em montante fixo”, conforme estabelece o artigo 16, VIII, da Lei 9.656. Ainda assim, acrescentou Andrighi, a coparticipação deve estar prevista no contrato.

Diante disso, ela passou a examinar se o protocolo Pediasuit se enquadra, de fato, na hipótese de atendimento ambulatorial, o que autorizaria a cobrança da cota. Para o TJ-MT, observou a ministra, tal protocolo “é considerado tratamento terapêutico para ganhos motores e comportamentais — portanto, trata-se de um tratamento complexo e não de mero atendimento ambulatorial”.

Já a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) estabelece que atendimento ambulatorial é aquele que se presta em consultório ou em ambulatório, definido e listado no rol de procedimentos em saúde. Também possui caráter de urgência e emergência, não incluindo internação ou procedimentos de diagnóstico ou terapia que, mesmo sem necessidade de internação, demandem o uso de estrutura hospitalar por período de mais de 12 horas. A ministra destacou, então, que a ANS também inclui na cobertura do plano ambulatorial os “procedimentos de reeducação e reabilitação física” listados na Resolução Normativa 65/2021.

“O protocolo Pediasuit é, em geral, aplicado em sessões conduzidas por fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e/ou fonoaudiólogos, dentro das respectivas áreas de atuação, sem a necessidade de internação ou mesmo da utilização de estrutura hospitalar, enquadrando-se, a despeito de sua complexidade, no conceito de atendimento ambulatorial”, anotou a ministra. “Assim, o tratamento com o protocolo Pediasuit pode ser objeto de cláusula contratual de coparticipação”, concluiu a relatora.

Ela destacou, por fim, que a quantia adicional paga mensalmente pelo beneficiário deve ter como limite o valor da mensalidade do plano. Acompanharam o voto os ministros Humberto Martins, Ricardo Villas Bôas Cueva e Moura Ribeiro.

Clique aqui para ler a decisão
REsp 2.001.108

https://www.conjur.com.br/2024-jan-12/cobranca-de-cota-por-tratamento-ambulatorial-nao-e-abusiva-decide-stj/

 

16/01/2024

Recuperação judicial não impede execução redirecionada a sócio após desconsideração da personalidade jurídica com base no CDC

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, que o deferimento de pedido de recuperação judicial de empresa que tenha sua personalidade jurídica desconsiderada não impede o andamento da execução redirecionada aos sócios. De acordo com o colegiado, eventual constrição dos bens dos sócios não afeta o patrimônio da empresa em recuperação, tampouco atinge a sua capacidade de reestruturação.

No mesmo julgamento, a turma entendeu que a desconsideração da personalidade jurídica com base na teoria menor prevista pelo artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor também se aplica às sociedades anônimas.

Diferentemente da teoria maior trazida pelo artigo 50 do Código Civil, a teoria menor admite a desconsideração apenas com a demonstração do estado de insolvência da empresa e de que a personalidade jurídica constitui obstáculo ao ressarcimento dos prejuízos causados, sem a necessidade de comprovação de desvio de finalidade ou da confusão patrimonial entre os sócios e a sociedade empresária.

No caso dos autos, a desconsideração da personalidade jurídica da empresa em recuperação ocorreu no âmbito de uma ação de consumo. A decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), segundo o qual a recuperação judicial não alcançaria as demandas envolvendo os devedores solidários, a exemplo dos sócios e dos administradores.

Ao STJ, os recorrentes alegaram ser acionistas – e não sócios – das empresas que tiveram a personalidade jurídica desconsiderada e que o veto ao parágrafo 1° do artigo 28 do CDC excluiria sua responsabilização pela teoria menor, uma vez que não seria possível a desconsideração das sociedades anônimas. Eles também defendiam a suspensão do cumprimento da execução em virtude do deferimento do pedido de recuperação judicial.

Tipo societário para fins de aplicação da teoria menor é irrelevante

O relator do caso no colegiado, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, citou precedentes do STJ (entre eles o REsp 1.658.648 e o REsp 1.900.843) para destacar que a teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica, embora não exija a prova de fraude, abuso de direito ou confusão patrimonial, não possibilita a responsabilização pessoal de quem não integra o quadro societário da empresa, ainda que atue nela como gestor, e de quem, mesmo que tenha a condição de sócio, não desempenha atos de gestão na sociedade.

Por outro lado, segundo o relator, a desconsideração da personalidade jurídica fundamentada na teoria menor pode ser admitida para sociedades anônimas, desde que seus efeitos se restrinjam às pessoas que detenham efetivo controle sobre a gestão da companhia. Nesse sentido, o ministro apontou precedente estabelecido pela Quarta Turma no AREsp 1.811.324, no qual o colegiado definiu que o tipo societário da empresa não é fator determinante para a aplicabilidade da teoria menor.

Em relação ao pedido de suspensão das execuções, Villas Bôas Cueva comentou que, conforme decidido pela Segunda Seção no REsp 1.333.349, o deferimento da recuperação judicial, a despeito de suspender as ações e as execuções contra e sociedade em recuperação, não impede o prosseguimento das execuções nem gera a suspensão ou a extinção de ações ajuizadas contra terceiros devedores solidários.

“Justamente por não afetar o patrimônio do devedor principal, ou seja, da empresa em recuperação, é que o legislador ressalvou os direitos e os privilégios dos credores contra coobrigados, fiadores e obrigados de regresso (artigo 49, parágrafo 1º, da LREF), admitindo o prosseguimento de eventuais execuções contra eles instauradas”, completou.

No caso concreto analisado, o ministro Cueva ressaltou que, segundo as instâncias ordinárias, os recorrentes são acionistas e controladores da sociedade, e, por consequência, possuem o poder de controle sobre a gestão da sociedade anônima que teve a personalidade desconsiderada. “No caso, portanto, não há óbice a que os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica recaiam sobre o patrimônio dos recorrentes”, concluiu.

Leia o acórdão no REsp 2.034.442.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 2034442
18/01/2024

Plano de saúde não pode recusar contratação com consumidor inscrito em cadastro de inadimplentes

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por maioria de votos, que o simples fato de o consumidor possuir negativação nos cadastros de inadimplentes não justifica, por si só, que a operadora recuse a contratação de plano de saúde. Segundo o colegiado, negar o direito à contratação de serviços essenciais por esse motivo constitui afronta à dignidade da pessoa, além de ser incompatível com os princípios do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

“Não há dúvida de que a autonomia da vontade e a liberdade de contratar seguem merecedoras de relevância, mas é preciso lembrar que sempre estarão limitadas ao atendimento da função social do contrato”, afirmou o ministro Moura Ribeiro no voto que foi acompanhado pela maioria do colegiado.

A consumidora ajuizou ação contra a operadora de saúde após sua adesão ao plano ter sido negada em virtude da existência de negativação nos cadastros restritivos, por débito anterior ao pedido de contratação. Em primeiro e segundo graus, a Justiça do Rio Grande do Sul determinou que a operadora efetuasse a contratação do plano de saúde pretendido pela autora, vedando qualquer exigência de quitação de dívidas para que fosse concluída a adesão.

No recurso ao STJ, a operadora alegou que a recusa na contratação tinha o objetivo de evitar a inadimplência já presumida da contratante. A operadora também sustentou que, nos termos da Lei 9.656/1998, não há impedimento à recusa de contratação com pessoas que estejam negativadas nos cadastros de inadimplentes.

Liberdade contratual deve ser exercida nos limites da função social do contrato

O ministro Moura Ribeiro destacou que, conforme previsto no artigo 421 do Código Civil, a liberdade contratual deve ser exercida nos limites da função social do contrato. Dessa forma, para o ministro, as relações jurídicas contratuais envolvem algo maior e que se põe acima da vontade e da liberdade das partes.

Moura Ribeiro explicou que não pode a parte, ao seu exclusivo desejo, agir pensando apenas no que melhor lhe convém, principalmente nos casos de contratos de consumo de bens essenciais como água, energia elétrica, saúde e educação.

“Em casos tais sobrepõem-se interesses maiores, visto que não há propriamente um poder de autonomia privada, porque o contratante (em especial o aderente) não é livre para discutir e determinar o conteúdo da regulação contratual. Nem sempre é livre, sequer, para contratar ou não contratar, visto que colocado diante de um único meio de adquirir bens ou serviços essenciais e indispensáveis à vida”, completou.

Fornecedor não pode se recusar, sem justa causa, a prestar produtos e serviços

Segundo o ministro, ao se submeter ao mercado de consumo, o fornecedor não pode se recusar, sem justa causa, a prestar os produtos e os serviços oferecidos. “Na hipótese dos autos, com todo respeito, não parece justa causa o simples temor, ou presunção indigesta, de futura e incerta inadimplência do preço”, ponderou.

De acordo com Moura Ribeiro, além de não se saber a razão da negativação anterior – tampouco se houve motivo justo para a restrição – o fato de o consumidor possuir registro em cadastro de inadimplentes não significa que ele também deixará de honrar obrigações futuras.

Por fim, o ministro registrou que a prestação dos serviços sempre pode ser interrompida se não houver o pagamento correspondente. Como consequência, para Moura Ribeiro, exigir que a contratação seja efetuada apenas mediante “pronto pagamento”, nos termos do que dispõe o artigo 39, inciso IX, do CDC, equivale a impor ao consumidor uma desvantagem manifestamente excessiva, o que é vedado pelo artigo 39, inciso V, do código.

“A contratação de serviços essenciais não mais pode ser vista pelo prisma individualista ou de utilidade do contratante, mas pelo sentido ou função social que tem na comunidade, até porque o consumidor tem trato constitucional, não é vassalo, nem sequer um pária”, concluiu ao negar provimento ao recurso da operadora.

Leia o acórdão no REsp 2.019.136.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 2019136
22/01/2024

Quarta Turma vê diferentes consequências do dever de informação em cirurgias eletivas e não eletivas

Para a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o descumprimento do dever de informação em procedimentos cirúrgicos tem implicações distintas conforme se trate de cirurgias eletivas ou não eletivas. Segundo o colegiado, em situações médicas mais urgentes, que exijam a realização de cirurgia não eletiva, a prestação de informações prévias sobre o procedimento terá menos influência na decisão do paciente ou da sua família do que nos casos em que a pessoa pode escolher não se submeter à intervenção se não quiser correr os riscos envolvidos.

O entendimento foi estabelecido em ação proposta pela mãe de uma paciente que morreu durante cirurgia para o tratamento de adenoide e retirada de amígdalas. Segundo os autos, a morte teria acontecido após choque anafilático causado pela anestesia geral.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) afastou a responsabilidade dos médicos que fizeram a operação, por entender, com base em laudo pericial, que não houve negligência, imprudência ou imperícia. Para o tribunal, mesmo com a realização dos exames pré-operatórios necessários, o risco sempre existe, pois não há exame capaz de prever, de forma absoluta, a possibilidade da ocorrência do choque anafilático em uma cirurgia.

Ainda segundo a corte fluminense, a morte da paciente não teria sido evitada mesmo que os médicos prestassem todos os esclarecimentos prévios sobre os possíveis riscos do ato cirúrgico.

Em recurso especial, a mãe da paciente alegou que a conduta dos médicos violou os deveres de informação e de transparência previstos nos artigos  e  do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Nas cirurgias não eletivas, preocupação é com o pleno restabelecimento da saúde

A ministra Isabel Gallotti, relatora no STJ, afirmou que, no caso de cirurgias necessárias ao restabelecimento da saúde – ou seja, quando há a necessidade premente do procedimento por motivo de saúde –, é menos provável que o dever de informação sobre eventuais riscos da anestesia possa afetar a decisão de submissão à cirurgia, pois a preocupação, nesse caso, é com o pleno restabelecimento de alguma função comprometida que impede o paciente de ter uma vida saudável.

“Nesse tipo de situação, quando a cirurgia é imperativa, o peso da informação sobre os riscos da anestesia não é o mesmo daquele existente nos casos de cirurgia plástica, por exemplo. Em se tratando de cirurgias não eletivas, a meu sentir, a informação a respeito dos riscos da anestesia não é o fator determinante para a decisão do paciente de se submeter ao procedimento ou não, sendo certo que, muitas das vezes, não realizá-lo não é opção”, completou.

No caso dos autos, a ministra ressaltou que, se fosse possível os médicos saberem de algum aumento do risco na aplicação da anestesia, em razão de informações previamente conhecidas sobre a pessoa, poderia se justificar o reconhecimento de negligência na cirurgia eletiva.

Contudo, enfatizou Isabel Gallotti, considerando que o óbito decorreu de reações adversas à anestesia e que não era possível prever a ocorrência do choque anafilático antes do procedimento, não há razão para condenar os médicos por falha no dever de informação.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 2097450

STJ concede liminares para autorizar o cultivo doméstico de Cannabis com fins medicinais sem risco de sanção criminal

O vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Og Fernandes, no exercício da presidência, deferiu liminares para assegurar que duas pessoas com comprovada necessidade médica possam cultivar em suas casas plantas de Cannabis sativa sem o risco de qualquer sanção criminal por parte das autoridades.

Nos recursos em habeas corpus submetidos ao STJ, as duas pessoas contaram que possuem problemas de saúde passíveis de tratamento com substâncias extraídas da Cannabis, como transtorno de ansiedade generalizada, transtorno de pânico, dor crônica e distúrbios de atenção.

Além de juntar aos processos laudos médicos que comprovam as condições de saúde relatadas, eles apresentaram autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para a importação excepcional de produtos medicinais derivados da Cannabis.

Tratamento possui custo elevado e produtos não estão disponíveis no mercado

Apesar dessa autorização, um dos pacientes alegou que o custo do tratamento seria elevado e incompatível com sua renda, razão pela qual entrou na Justiça para obter o habeas corpus preventivo e poder cultivar a planta sem sofrer consequências penais.

Já o segundo recorrente sustentou que, apesar de possuir a autorização da Anvisa para a importação, utiliza apenas produtos de seu próprio cultivo, pois alguns outros tratamentos prescritos, tais como as flores in natura, não estão disponíveis no mercado nacional ou internacional.

Inicialmente, todos os pedidos foram rejeitados nos tribunais estaduais. O Tribunal de Justiça de São Paulo e o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que julgaram os casos, entenderam que a autorização de plantio e cultivo dependeria de análise técnica cuja competência não caberia à Justiça, mas sim à Anvisa.

Pacientes comprovaram efetividade do tratamento com canabidiol

Segundo o ministro Og Fernandes, os interessados apresentaram documentos que comprovam as suas necessidades de saúde, tais como receitas médicas, autorizações para importação e evidências de que os tratamentos médicos tradicionais não obtiveram êxito semelhante aos resultados obtidos com o uso do óleo canabidiol.

Og Fernandes também destacou que, de acordo com os precedentes do STJ, a conduta de cultivar a planta para fins medicinais não é considerada crime, em virtude da falta da regulamentação prevista no artigo 2º, parágrafo único, da Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas). Com essa interpretação, apontou, diversos acórdãos já concederam salvo-conduto para permitir que pessoas com determinados problemas de saúde pudessem realizar o cultivo e a manipulação da Cannabis.

Como consequência, o ministro reconheceu a viabilidade jurídica dos pedidos e julgou ser mais prudente proteger o direito à saúde dos envolvidos até o julgamento de mérito dos recursos ordinários pelas turmas competentes no STJ.

Os números destes processos não são divulgados em razão de segredo judicial.

https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2024/22012024-STJ-concede-liminares-para-autorizar-o-cultivo-domestico-de-cannabis-com-fins-medicinais-sem-risco-de-sancao.aspx

 

É possível ampliar a curatela para preservar pessoa com deficiência

Em caráter excepcional, e desde que devidamente fundamentado, é possível ampliar a curatela com o objetivo de preservar a dignidade e os interesses do curatelado. Esse entendimento é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que discutiu se, após a entrada em vigor do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015), é admissível a declaração de incapacidade total e a curatela ampla e absoluta caso haja excepcionalidades que justifiquem essa medida.

Venceu no colegiado do STJ a divergência aberta pelo ministro Villas Bôas Cueva. Para ele, a concessão da curatela limitada apenas aos atos de natureza negocial e patrimonial “pouco atenderia às necessidades do curatelado”, que, segundo laudo pericial, não tem autonomia para o exercício pessoal dos demais atos da vida civil, dado o comprometimento da capacidade de discernimento, cognição e avaliação de risco.

“A efetiva inclusão social do curatelado, no caso, será resguardada e protegida com a extensão da curatela para outros atos da vida civil, medida excepcional, mas que se mostra adequada e devidamente justificada”, disse Cueva.

O magistrado foi seguido em seu voto pelos ministros Humberto Martins, Marco Aurélio Bellize e Moura Ribeiro. A relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, ficou vencida.

De acordo com ela, desde a Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência e da entrada em vigor do Estatuto da Pessoa com Deficiência, não há, do ponto de vista normativo, nenhum espaço para que se continue afirmando que pessoas com deficiência são civil ou juridicamente incapazes de forma absoluta.

Em regra, disse a ministra, a curatela deve se restringir aos atos de natureza patrimonial, ainda que possa, em casos excepcionais, ser ampliada para abranger os demais atos da vida civil. A ministra, no entanto, não viu excepcionalidade no caso concreto.

“Da análise de todos os elementos fático-probatórios minuciosamente descritos no acórdão recorrido, verifica-se que o laudo pericial é conclusivo no sentido de que a deficiência do recorrente é moderada e que ele é capaz de manifestar a sua vontade, ainda que com determinadas limitações ou restrições”, afirmou a relatora.

Clique aqui para ler o voto de Nancy Andrighi
Clique aqui para ler o voto de Villas Bôas Cueva
REsp 2.013.021

https://www.conjur.com.br/2024-jan-22/e-possivel-ampliar-a-curatela-para-preservar-pessoa-com-deficiencia-diz-stj/

 

24/01/2024

Após Lei 14.112/2020, certidão negativa fiscal é indispensável para deferimento da recuperação

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), com a entrada em vigor da Lei 14.112/2020 e havendo programa de parcelamento tributário implementado, tornou-se indispensável a apresentação das certidões negativas de débito tributário – ou certidões positivas com efeito de negativas – para o deferimento da recuperação judicial.

O entendimento foi estabelecido pelo colegiado ao negar recurso especial em que um grupo empresarial sustentava, entre outros argumentos, que a exigência de comprovação de regularidade fiscal para o deferimento da recuperação seria incompatível com o objetivo de preservar a função social da empresa.

Ainda de acordo com as empresas recorrentes, a dispensa das certidões negativas não traria prejuízo à Fazenda Pública, tendo em vista que as execuções fiscais não são atingidas pelo processamento da recuperação judicial.

O caso teve origem em pedido de recuperação no qual o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) determinou, de ofício, que as empresas providenciassem a regularização fiscal, sob pena de decretação de falência. Além de questionar essa exigência, as empresas recorreram ao STJ alegando que o tribunal proferiu decisão extra petita ao determinar a apresentação da documentação fiscal.

STJ modificou entendimento sobre obrigatoriedade da certidão após Lei 14.112/2020

O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, relator, lembrou a evolução do tema no STJ. Segundo ele, após a entrada em vigor da Lei 11.101/2005, a corte entendeu que, por não ter sido editada lei que tratasse especificamente do parcelamento dos débitos tributários das empresas em recuperação, não se poderia exigir a apresentação das certidões indicadas no artigo 57 daquela norma, nem a quitação prevista no artigo 191-A do Código Tributário Nacional, sob pena de tornar inviável o instituto da recuperação judicial.

Depois da edição da Lei 14.112/2020 – que, de acordo com o ministro, implementou “um programa legal de parcelamento factível” para as dívidas federais –, a Terceira Turma, no REsp 2.053.240, passou a considerar não ser mais possível dispensar a apresentação das certidões negativas de débitos fiscais para o deferimento da recuperação.

“Logo, após as modificações trazidas pela Lei 14.112/2020, a apresentação das certidões exigidas pelo artigo 57 da Lei 11.101/2005, com a ressalva feita em relação aos débitos fiscais de titularidade das fazendas estaduais, do Distrito Federal e dos municípios, constitui exigência inafastável, cujo desrespeito importará na suspensão da recuperação judicial”, completou.

Ausência de certidões não resulta em falência, mas na suspensão da recuperação

Segundo o voto do ministro Cueva, constatada a violação ao artigo 57 da Lei 11.101/2005, o TJSP poderia analisar a questão de ofício – ou seja, sem necessidade de manifestação da parte credora sobre o assunto.

Apesar dessa possibilidade, o relator destacou que a não apresentação das certidões fiscais não resulta na decretação de falência da empresa – por falta de previsão legal nesse sentido –, mas sim na suspensão da recuperação judicial.

Leia o acórdão no REsp 2.082.781.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 2082781

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF)

03/01/2024

Alexandre de Moraes derruba vínculo de emprego entre terceirizado e empresa

É lícita a terceirização de toda e qualquer atividade, meio ou fim, não se configurando relação de emprego entre a contratante e o empregado da contratada.

Com esse entendimento, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, julgou procedente uma reclamação ajuizada por uma empresa de transportes condenada a pagar direitos trabalhistas a um motorista terceirizado.

A ação trabalhista foi julgada procedente pela Justiça do Trabalho e motivou o ajuizamento da reclamação constitucional, por ofender a posição do STF nos julgamentos da ADPF 324 e do RE 958.252.

O caso trata de uma empresa de transportes que celebrou contrato de prestação de serviços com um município baiano e optou por terceirizar a função, fazendo contratos de locação de serviço tripulado.

De acordo com esses contratos, o locador deveria ceder o veículo e contratar um motorista para dirigi-lo, sem quaisquer ônus e encargos à locatária. Portanto, a escolha do locador de dirigir pessoalmente ou não o veículo não teria relevância jurídica.

A Justiça do Trabalho, no entanto, considerou que haveria relação de emprego. A sentença foi confirmada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região. O escritório R. Pitombo de Cristo Sociedade Individual de Advocacia levou o caso ao Supremo.

Ao apreciar o caso, o ministro Alexandre de Moraes observou que o STF já decidiu que não há irregularidade na contratação de pessoa jurídica formada por profissionais para prestar serviços terceirizados na atividade-fim da contratante.

“A interpretação conjunta dos precedentes permite o reconhecimento da licitude de outras formas de relação de trabalho que não a relação de emprego regida pela CLT, como na própria terceirização ou em casos específicos, como a previsão da natureza civil da relação decorrente de contratos firmados nos termos da Lei 11.442/2007”, disse.

Clique aqui para ler a decisão
Rcl 64.532

https://www.conjur.com.br/2024-jan-03/alexandre-de-moraes-derruba-vinculo-de-emprego-entre-terceirizado-e-empresa/

 

17/01/2024

STF afasta vínculo de emprego de médica contratada como PJ por casa de saúde em SP

Ministro Alexandre de Moraes aplicou entendimento reiterado do Tribunal sobre a matéria.

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), anulou decisão da Justiça do Trabalho que havia reconhecido o vínculo de emprego entre uma médica e a Casa de Saúde Santa Marcelina, em São Paulo. Na decisão, tomada na Reclamação (RCL) 65011, o ministro aplicou o entendimento do Tribunal sobre a validade de formas de relação de trabalho que não a regida pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Contrato de trabalho

A médica pretendia, na ação trabalhista, que fosse reconhecido o vínculo entre 2014 e 2019, quando trabalhou na casa de saúde por meio de contrato de prestação de serviços. Ela alegava ter sido contratada com carga horária fixa e estar sujeita às imposições do hospital, em flagrante fraude à legislação trabalhista, pois era obrigada a emitir nota fiscal como pessoa jurídica.

A primeira instância reconheceu o vínculo de emprego, e o entendimento foi mantido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) e pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST).

No STF, o hospital alegou que a empresa da médica fora criada em 2002, mais de uma década antes da prestação de serviços, e que sua contratação se dera sem demandas pré-estabelecidas, a partir da solicitação de outras equipes para participação complementar no atendimento médico. Segundo seu argumento, as relações de trabalho não se baseiam em um único modelo rígido, e as partes podem decidir a melhor forma de organizar a prestação de serviços.

Pessoa jurídica

Ao acolher o pedido da casa de saúde, o ministro Alexandre de Moraes explicou que a interpretação conjunta de precedentes do STF, como o Recurso Extraordinário (RE) 958252 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 324, reconhece a validade de outras formas de relação de trabalho que não a relação de emprego regida pela CLT. Assim, a conclusão adotada pela Justiça do Trabalho contrariou esse entendimento.

Ele lembrou ainda, que em casos semelhantes envolvendo a chamada pejotização, a Primeira Turma tem decidido no mesmo sentido.

Leia a íntegra da decisão.

EC/AD//CF

TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO (TST)

 

10/01/2024

Servente de limpeza receberá hora extra por causa de divisão de intervalo

O intervalo era interrompido cerca de três vezes na semana

A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho restabeleceu decisão que condenou a Única – Limpeza e Serviços Ltda. a pagar horas extras a uma servente de limpeza por fracionar o intervalo para descanso dela. A prática ocorria cerca de três dias na semana. De acordo com os ministros, o fracionamento do repouso, em regra, equivale à sua concessão parcial, com a necessidade de pagamento extraordinário.

Intervalo dividido

A servente de limpeza, contratada para trabalhar nas Unidades de Pronto Atendimento de Campinas (SP) em jornada de 12×36, relatou que o empregador a obrigava a fracionar o intervalo para repouso de 1h em diversos períodos diariamente. Neste sentido, em reclamação trabalhista, pediu o pagamento de uma hora extra por dia em que houve divisão do tempo de repouso.

O juízo de primeiro grau deferiu o pagamento das horas extras. Em seguida, o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas/SP) reformou a sentença, apesar de ter confirmado que, cerca de três vezes por semana, os intervalos eram interrompidos, e a mulher voltava ao trabalho. Depois, retornava ao repouso. Para o TRT, não houve supressão do intervalo. No entendimento dos desembargadores, “a mera interrupção do intervalo intrajornada, com seu gozo integral em prosseguimento, não autoriza a condenação. Desta forma, dá-se provimento ao apelo para afastar a condenação ao pagamento do intervalo intrajornada e reflexos.”

Horas extras

Houve recurso de revista da trabalhadora ao TST, e o relator na Sétima Turma, ministro Cláudio Brandão, votou no sentido de restabelecer a decisão de primeiro grau. Inicialmente, ele explicou que a Lei 13.467/2017 (Reforma Trabalhista) estabeleceu que a não concessão ou a concessão parcial do intervalo para repouso e alimentação implica o pagamento de natureza indenizatória apenas do período suprimido, com acréscimo de 50% sobre o valor da hora trabalhada.

Contudo, o relator explicou que a norma não se aplica ao caso, porque os fatos ocorreram antes da data de início da vigência da lei, 11/11/2017. “A não concessão ou a concessão parcial, incluindo-se a hipótese de fracionamento do período intervalar, implica o pagamento integral do período, principalmente porque antecede à entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017”.

O ministro disse que o TST firmou entendimento na Súmula 437, item I, de 2012, sobre o pagamento de horas extras no caso de concessão parcial do intervalo: “Após a edição da Lei nº 8.923/94, a não concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo para repouso e alimentação a empregados urbanos e rurais implica o pagamento total do período correspondente, e não apenas daquele suprimido, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho, sem prejuízo do cômputo da efetiva jornada de labor para efeito de remuneração.”.

Efeito da divisão

De acordo com o relator, o fracionamento do intervalo intrajornada equivale à sua concessão parcial, pois retira da norma parte de sua função biológica, que é conceder ao empregado um período adequado como medida de higiene, saúde e segurança, que lhe permita, de forma efetiva, o repouso, a alimentação e o restabelecimento da força de trabalho.

Por outro lado, o ministro Cláudio Brandão esclareceu que a redução e/ou fracionamento somente é admitido nas hipóteses previstas no parágrafo 5º do artigo 71 da CLT ou quando previsto em acordo ou convenção coletiva, conforme entendimento consolidado pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 1046 da Repercussão Geral. “O que não é o caso em questão”, concluiu.

Por unanimidade, os ministros da Sétima Turma acompanharam o voto do relator.

Processo: RR-11460-42.2020.5.15.0130

https://www.tst.jus.br/-/servente-de-limpeza-recebera-hora-extra-por-divis%C3%A3o-de-intervalo

11/01/2024

Norma coletiva que ampliou tempo sem remuneração para troca de uniformes é invalidada

Para a 3ª Turma, o limite de 10 minutos diários não pode ser flexibilizado

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho considerou inválida norma coletiva que permitia que empregados da fábrica da BRF S.A. em Rio Verde (GO) ficassem mais de cinco minutos antes e depois da jornada para troca de uniforme sem remuneração extra, ao contrário do que prevê a CLT. Os ministros aplicaram entendimento do Supremo Tribunal Federal de que norma coletiva não pode flexibilizar o limite de 5 minutos na entrada e na saída, totalizando 10 minutos diários, nos termos do artigo 58, parágrafo 1º, da CLT.

Minutos para troca de uniforme

Assim, o colegiado restabeleceu sentença que condenou a empresa a pagar para um operador de produção 25 minutos diários como de serviço extraordinário realizado de 2013 a 2015, anos de início do contrato e da apresentação da reclamação trabalhista. Essa sentença do juízo da 1ª Vara do Trabalho de Rio Verde (GO) tinha sido reformada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região antes de o processo chegar ao TST. Para o Regional, a norma coletiva prevalece sobre a lei.

STF

O relator do recurso do operador na Terceira Turma do TST, ministro Mauricio Godinho Delgado, explicou que o STF, no julgamento do ARE 1.121.633, asseverou a necessidade de se observar a jurisprudência consolidada do TST e do próprio STF no exame judicial dos limites da negociação coletiva e na definição dos direitos trabalhistas considerados indisponíveis, por pertencerem ao grupo de normas que estabelecem um patamar mínimo civilizatório dos trabalhadores.

Por meio do voto condutor do Ministro Gilmar Mendes, o Supremo menciona e ratifica a jurisprudência do TST de que as regras que estabelecem o limite legal de 5 (cinco) minutos que antecedem e sucedem a jornada de trabalho não podem ser suprimidas ou alteradas por normas coletivas.

Jurisprudência do TST

Na Justiça do Trabalho, o ministro Godinho Delgado explicou que a regulação desse tempo à disposição do empregador, originalmente, foi realizada pela prática jurisprudencial, OJ 23 da SDI-1/TST, de 1996 (hoje, Súmula 366). Anos depois, tornou-se expressa no artigo 58, parágrafo 1º, da CLT, após a inserção feita pela Lei 10.243/2001. “Observe-se que, desde a vigência da Lei 10.243/01 (Diário Oficial de 20.6.2001), a regra do tempo residual à disposição tornou-se imperativa, deixando de ser mera construção extensiva da interpretação jurisprudencial”.

Em consequência, o ministro afirmou que se tornaram inválidos dispositivos de convenções ou acordos coletivos de trabalho que eliminem o direito trabalhista ou estabeleçam regra menos favorável (como o elastecimento do limite de cinco minutos no início e no fim da jornada fixados na lei, ou dez minutos no total). Nesta linha, a OJ 372, SDI-I/TST, editada em dezembro de 2008 (que, em 2014, foi convertida na Súmula 449 do TST).

Reforma Trabalhista

Na análise do recurso, o ministro Mauricio Godinho destacou que a Lei 13.467/2017 (Reforma Trabalhista) permitiu flexibilização, via negociação coletiva trabalhista, nesse aspecto, por meio do novo artigo 611-A, caput e inciso I, CLT. “A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre (…) pacto quanto à jornada de trabalho, observados os limites constitucionais”, dispõe a lei.

A lei da Reforma Trabalhista também procurou excluir períodos anteriormente considerados como tempo à disposição do empregador, conforme o disposto no novo parágrafo 2º do artigo 4º da CLT. “Por não se considerar tempo à disposição do empregador, não será computado como período extraordinário o que exceder a jornada normal, ainda que ultrapasse o limite de cinco minutos previsto no parágrafo 1º do artigo 58 da CLT, quando o empregado, por escolha própria, buscar proteção pessoal, em caso de insegurança nas vias públicas ou más condições climáticas, bem como adentrar ou permanecer nas dependências da empresa para exercer atividades particulares”. Entre essas atividades está a  troca de roupa ou uniforme, quando não houver obrigatoriedade de realizar a troca na empresa.

O ministro afirmou ser inegável que, antes da Lei 13.467/2017, prevalece a natureza indisponível do direito, consagrada no artigo 58, parágrafo 1º da CLT e pela pacífica jurisprudência do TST (Súmulas 366 e 449 do TST).  “Deve ser considerada inválida a norma coletiva que aumenta o limite de 5 minutos que antecedem e sucedem a jornada de trabalho para fins de apuração das horas extras (salientando-se que, no caso concreto, a situação fático-jurídica é anterior à Lei 13.467/2017, quando, de fato, sequer existia qualquer expresso permissivo jurídico heterônomo a autorizar a incidência da criatividade normativa negocial)”, concluiu a Terceira Turma do TST.

A decisão foi unânime.

Processo: TST-RRAg-11113-88.2015.5.18.0101

https://www.tst.jus.br/-/norma-coletiva-que-ampliou-tempo-sem-remunera%C3%A7%C3%A3o-para-troca-de-uniformes-%C3%A9-invalidada

 

12/01/2024

Dispensa de motorista com transtorno afetivo bipolar é julgada discriminatória

Trabalhador deve receber indenização por danos extrapatrimoniais

A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho declarou o caráter discriminatório da dispensa de um motorista carreteiro da Rumo Malha Sul S.A. com transtorno afetivo bipolar. Também reconheceu o direito dele à reparação pelo prejuízo extrapatrimonial. O valor da indenização não foi definido pelo colegiado do TST, que determinou o retorno dos autos à 1ª Vara do Trabalho de Curitiba (PR) para que prossiga no julgamento e  arbitre quanto o trabalhador deve receber.

Afastamentos

Contratado em 2012 e dispensado em 9/9/2013, o motorista carreteiro afirmou, no processo, que estava inapto para o trabalho na data da dispensa. Alegou que a empresa tinha conhecimento dos sucessivos afastamentos previdenciários e afirmou que a dispensa ocorreu enquanto ele aguardava a decisão judicial sobre o restabelecimento do último benefício previdenciário. Em seguida, o auxílio-doença foi restabelecido de forma retroativa a 1º/4/2013, ou seja, data anterior à rescisão contratual. Além da nulidade da dispensa, ele pediu indenização por danos morais, argumentando que a dispensa foi discriminatória, decorrente de sofrer de transtorno afetivo bipolar.

Dispensa nula

Ao julgar o caso, o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) declarou a nulidade da dispensa, mas rejeitou o pedido de indenização. Conforme o TRT, o restabelecimento do benefício previdenciário implica reconhecimento de que, no momento da dispensa, em 9/9/2013, o contrato de trabalho encontrava-se suspenso, “não sendo possível efetuar a sua rescisão enquanto perdurar o período de licença”.

Quanto à indenização, entendeu serem inaplicáveis a Lei 9.029/1995 e a Súmula 443 do TST, que presume discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito, sendo o ato inválido e com o empregado tendo direito à reintegração no emprego. Para o TRT, a enfermidade que acomete o trabalhador (transtorno afetivo bipolar) não se enquadraria como “doença grave que suscite estigma ou preconceito” e, assim, não poderia ser presumida a dispensa discriminatória. No caso, segundo o Tribunal Regional, não houve ilegalidade por parte da empregadora, e caberia ao trabalhador demonstrar que a rescisão contratual foi motivada pela doença psiquiátrica.

Doença, estigma e preconceito

Com entendimento diverso do TRT, o relator do recurso de revista do motorista ao, ministro Agra Belmonte, destacou que não se sustenta a tese defendida no acórdão regional de que os transtornos psiquiátricos não provocam estigma e preconceito, pois essa percepção “encontra-se absolutamente desconectada da ciência e da realidade social”. Na avaliação do ministro, é difícil escapar da presunção de que o rompimento unilateral do vínculo empregatício “teve por motivação a intenção da empregadora de não contar em seus quadros com trabalhador suscetível a essa enfermidade”.

Segundo Agra Belmonte, mesmo sendo direito do empregador rescindir unilateralmente o contrato de trabalho, “tal prerrogativa não deve se sobrepor a todo o acervo constitucional e legal construído, democraticamente, com o intuito de salvaguardar os conceitos de igualdade, de solidariedade, de função social do trabalho, de dignidade da pessoa humana”, assinalou. Isso, principalmente, diante do contexto histórico atual, em que “a adoção de políticas afirmativas de inclusão de grupos minoritários, inclusive dos portadores de necessidades especiais e de doenças graves e/ou estigmatizantes, floresce na população brasileira”.

Condutas discriminatórias

O ministro citou também precedentes do TST de casos análogos que, embora não versem especificamente da situação examinada, tratam do caráter estigmatizante das doenças psiquiátricas. Mais ainda, salientou a jurisprudência atual de que as condutas discriminatórias descritas no artigo 1º da Lei 9.029/1995 constituem “elenco meramente exemplificativo”, notadamente pelo fato de a Lei 13.146/2015 inserir a expressão “entre outros” na redação original daquele dispositivo.

A Sétima Turma do TST, considerando que a averiguação da situação atual do trabalhador e a verificação da viabilidade de sua reintegração aos quadros da empresa escapam ao papel da instância extraordinária, determinou o retorno dos autos à Vara do Trabalho de origem. O relator assinalou também que, embora tenha sido reconhecida a existência do dano moral, a ausência de detalhamento fático no acórdão regional acerca da extensão da ofensa aos direitos da personalidade “recomenda que o magistrado de primeiro grau proceda ao arbitramento do quantum devido ao trabalhador”.

A decisão foi unânime, mas foram apresentados recursos, ainda não julgados.

(Lourdes Tavares/GS)

Processo: ARR-184-88.2014.5.09.0001 

https://www.tst.jus.br/-/dispensa-de-motorista-com-transtorno-afetivo-bipolar-%C3%A9-julgada-discriminat%C3%B3ria%C2%A0

16/01/24

Decisões abordam vagas de emprego para pessoas com deficiência ou readaptadas

Processos julgados pela 3ª e pela 1ª Turma envolvem formas de divulgação das vagas e cabimento de indenização por danos morais coletivos.

De acordo com o artigo 93 da Lei 8.213/1991, empresas com mais de mil empregados precisam ter no mínimo 5% de seus postos de trabalho ocupados por pessoas com deficiência ou reabilitadas. O descumprimento dessa cota resultou em duas decisões destacadas por Turmas do Tribunal Superior do Trabalho.

Falta de dinheiro

O primeiro caso diz respeito a uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) contra a Uniesp S.A. Embora a universidade tivesse 1.688 postos de trabalho em setembro de 2019, apenas três deles eram ocupados por pessoas com deficiência.

A empresa admitiu a irregularidade e atribuiu o problema a dificuldades financeiras e à falta de pretendentes às vagas, anunciada apenas em uma página na internet voltada para seleções.

Ao condenar a Uniesp a cumprir a cota e a pagar R$ 200 mil de indenização por dano moral coletivo, o juízo da 33ª Vara do Trabalho de São Paulo ressaltou que a justificativa de falta de dinheiro não afasta a obrigação de cumprir a lei, inclusive porque a universidade não buscou fazer acordo ao longo do processo para mitigar as dificuldades.

Contudo, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região excluiu a indenização, por considerar que não havia evidência da repercussão do descumprimento na esfera psíquica e extrapatrimonial da coletividade.

Ao julgar recurso do Ministério Público do Trabalho (MPT) e restabelecer a sentença, a Terceira Turma do TST concluiu que a não observância da cota legal atinge a todas as pessoas com deficiência ou reabilitadas que poderiam ingressar no mercado de trabalho. “Trata-se de incontroverso ato lesivo a toda uma coletividade, que prescinde de comprovação”, afirmou o relator, ministro Alberto Balazeiro.

Ainda de acordo com a decisão, a divulgação de vagas apenas na internet não é suficiente para atender à exigência da lei. “Não houve divulgação em jornais de grande circulação, rádios ou meio de transporte público; não houve o cadastro da Uniesp no Sistema Nacional de Emprego, nem contato com a prefeitura local, colégios da região e Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais”, ressaltou o relator.

Falta de anúncio

A falha no anúncio de vagas resultou também na condenação, em outro processo, da Coasul Cooperativa Agroindustrial, do Paraná, ao efetivo cumprimento da cota, conforme decisão da Primeira Turma do TST. Para o colegiado, o empregador não cumpriu o ônus de demonstrar que havia ofertado vagas.

Inicialmente, a Turma observou que, de acordo com o entendimento do TST, se a empresa comprovar que fez todos os esforços para cumprir a cota, ela não deve ser responsabilizada por não conseguir alcançar o percentual por motivo alheio à sua vontade. Porém, esse não é o caso da Coasul.

Entre outros aspectos, ficou demonstrado que a empresa não cumpre esse dever legal há mais de dez anos. “Não há notícia de que, ao longo desse período e por causa da ausência de avanços nos resultados das ações implementadas, a Coasul tenha adotado novas e eficientes medidas a fim de alcançar o percentual previsto em lei. Com mais de 53 unidades no Paraná, a empresa não consegue preencher a cota de 5%”, assinalou o ministro Hugo Scheuermann, relator do caso.

De acordo com a decisão, para superar o dever de comprovação, não basta que a empresa mostre no processo ações noticiando a existência de vagas de trabalho para pessoas com deficiência. “É imprescindível que demonstrem a realização de esforços firmes, sistemáticos, eficazes e compatíveis com a vontade real de querer contratar esses trabalhadores, promovendo e garantindo condições de acesso e de permanência das pessoas com deficiência no mercado de trabalho”. Para o colegiado, a Coasul não se desincumbiu desse ônus.

As decisões foram unânimes.

https://www.tst.jus.br/-/decis%C3%B5es-abordam-vagas-de-emprego-para-pessoas-com-defici%C3%AAncia-ou-readaptadas

 

Infraero deve pagar a trabalhador adicional de periculosidade retroativo

O adicional de periculosidade é devido desde o momento em que o trabalhador passa a ser exposto ao agente periculoso, devendo ser aplicado de maneira retroativa.

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) a pagar a um operador de serviços aeroportuários de São Paulo o adicional de periculosidade retroativo ao momento em que as condições perigosas de trabalho foram identificadas.

Para o colegiado, uma cláusula do acordo coletivo firmado entre a Infraero e o Sindicato Nacional dos Empregados em Empresas Administradoras de Aeroportos (Sina), segundo a qual o adicional é devido desde o momento em que o aeroportuário passa a ser exposto ao perigo, implicou renúncia da empresa ao prazo prescricional. Além disso, os ministros destacaram que o direito é reconhecido pela jurisprudência do TST.

Conforme a reclamação trabalhista, o aeroportuário atuava no abastecimento de aeronaves, considerada atividade de risco. Apesar disso, ele não recebia o adicional de periculosidade de 30%. Ele argumentou que, em razão da cláusula do acordo coletivo, a estatal renunciou à prescrição quinquenal. Por isso, reivindicou o pagamento da diferença desde a sua contratação, em março de 2003, até dezembro de 2020.

O juízo da 67ª Vara do Trabalho de São Paulo não acolheu o argumento do empregado e julgou improcedente o pedido de adicional de periculosidade no período abrangido pela prescrição.

O empregado, então, recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (Grande São Paulo e litoral paulista), que manteve a decisão. Para a 11ª Turma do TRT-2, não era possível inferir, a partir do acordo coletivo, que a Infraero renunciou ao prazo prescricional.

No entanto, ao julgar o recurso interposto pelo operador de serviços aeroportuários, o ministro relator no TST, Alberto Bastos Balazeiro, deu razão ao empregado. Segundo ele, ao interpretar a mesma cláusula coletiva firmada pela Infraero, a jurisprudência da corte se firmou no sentido de que o adicional de periculosidade é devido em todo o período retroativo, desde o momento da constatação do trabalho em condições perigosas.

Em voto convergente, o ministro Mauricio Godinho Delgado enfatizou que o teor da norma coletiva evidencia que a Infraero adotou uma conduta incompatível com a prescrição quinquenal. Isso se deve ao fato de que a empresa reconheceu o direito ao adicional de periculosidade, assim como a retroatividade dos efeitos financeiros dessa parcela, sem apresentar quaisquer ressalvas.

A 3ª Turma afastou a prescrição e determinou o pagamento do adicional de periculosidade desde o momento da constatação do trabalho em condições perigosas. A decisão foi unânime. Com informações da assessoria de imprensa do TST.

RR 1001363-21.2020.5.02.0067

https://www.conjur.com.br/2024-jan-16/infraero-deve-pagar-a-trabalhador-adicional-de-periculosidade-retroativo/

 

Empresa terá de fornecer prótese a empregado que teve mão amputada em acidente

Para a 3ª Turma, as despesas são inerentes à responsabilidade civil do empregador

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou uma microempresa em Salto (SP) a custear o tratamento de um operador de produção que terá de implantar uma prótese mecânica após ter a mão amputada em acidente de trabalho. A indenização consiste em pagar as despesas com tratamento,  aquisição, manutenção e substituição periódicas de próteses.

Cilindro

A empresa produz compostos de borracha e, segundo o empregado, sua função era inserir uma folha de borracha numa máquina de cilindros – semelhante à máquina de moer cana, mas em escala muito maior. O material era inserido e reinserido enquanto o cilindro girava várias vezes, e, durante esse processo, sua mão ficou pressa e foi puxada junto com a borracha para dentro do cilindro, causando esmagamento de alguns dedos e o desprendimento da pele.

Abalo

Na reclamação trabalhista, o empregado disse que usava luvas inadequadas para a atividade e que não tinha sido capacitado para operar a máquina. Ele pediu indenizações por dano material e estético, alegando que a amputação causou abalos emocionais para ele e para a família.

Desatenção

A empresa alegou que a culpa seria toda do trabalhador, que teria desrespeitado as orientações dadas nos treinamentos de integração. Sustentou, ainda, que o acidente decorrera de pressa e desatenção no manuseio da máquina diante da possibilidade de saída antecipada do serviço.

Indenização

A Vara de Trabalho de Salto condenou a microempresa a pagar pensão mensal vitalícia, indenização por danos morais e estéticos de R$ 70 mil e indenizações à mulher e ao filho do empregado. Contudo, negou o pedido de custeio da prótese.

Laudo pericial

O TRT da 15ª Região (Campinas-SP) manteve a sentença. A decisão levou em conta a informação do laudo pericial de que a utilização e a escolha de próteses exigem um estudo sobre a adequação do material. Ainda segundo o TRT, o INSS havia deferido benefício acidentário mas, no momento da perícia, o operador não havia se direcionado ao setor de reabilitação e teve o benefício cessado.

Dever de restituir

Já no TST, o relator do recurso do empregado, ministro Mauricio Godinho Delgado, votou pela condenação da empresa a custear as despesas médicas com o tratamento para implantação da prótese mecânica, que deverão ser oportunamente comprovadas nos autos. Segundo ele, a medida integra o dever de restituir integralmente as despesas com tratamento médico e é inerente à responsabilidade civil.

Natureza distinta

O ministro ressaltou que a indenização por danos materiais (que resulta de doença ocupacional e envolve a culpa do empregador)  não se confunde com o benefício previdenciário do INSS, que tem natureza distinta porque decorre do dever de prestação assistencial pelo Estado de forma ampla. Assim, as parcelas são cumuláveis. De acordo com o relator, o acesso ao serviço público de saúde não desonera o empregador de sua responsabilidade, sobretudo diante da notória precariedade do atendimento.

https://www.tst.jus.br/-/empresa-ter%C3%A1-de-fornecer-pr%C3%B3tese-a-empregado-que-teve-m%C3%A3o-amputada-em-acidente

17/01/24

Sindicato não pagará honorários por perder ação sobre adicional de periculosidade

O motivo é que ele atuou como substituto da categoria e não houve má-fé na ação judicial.

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o exame de recurso da Companhia Energética de Pernambuco (Celpe) que cobrava o pagamento de honorários advocatícios do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Urbanas no Estado de Pernambuco (Sindurb), que perdeu uma ação judicial sobre adicional de periculosidade. A decisão segue o entendimento do TST de que o sindicato, quando atua como substituto processual da categoria, não deve arcar com a parcela, a não ser que seja comprovada má-fé.

Adicional

A finalidade da reclamação trabalhista ajuizada pelo Sindurb era obter na Justiça o pagamento de diferenças salariais por suposto cálculo incorreto do adicional de periculosidade.

O juízo da 14ª Vara do Trabalho de Recife e o Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região negaram o pedido, ao concluírem que a empresa havia comprovado o pagamento da parcela e que o sindicato não teria apresentado provas das ilegalidades alegadas. Contudo, o sindicato não foi condenado a pagar honorários advocatícios pela perda da causa.

Honorários advocatícios

O relator do recurso da Celpe, ministro José Roberto Freire Pimenta, explicou que os honorários advocatícios são devidos pela chamada sucumbência (perda da ação) sempre que o sindicato reivindicar direito próprio. No caso, porém, ele atuou em nome das pessoas por ele representadas, situação conhecida como substituição processual típica, e não em nome próprio. “Considerando-se que não houve comprovação de má-fé do sindicato nas pretensões apresentadas em juízo, não cabe falar em imposição do ônus de arcar com honorários advocatícios”, concluiu.

A decisão foi unânime, e a Celpe apresentou recurso extraordinário, para que o processo seja analisado pelo Supremo Tribunal Federal.

https://www.tst.jus.br/-/sindicato-n%C3%A3o-pagar%C3%A1-honor%C3%A1rios-por-perder-a%C3%A7%C3%A3o-sobre-adicional-de-periculosidade

26/01/2024

Demissão em massa sem negociação com sindicato é inadmissível, reforça TST

Conforme foi estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal por meio de uma tese de repercussão geral, é imprescindível a participação sindical para a dispensa em massa. Com base nesse entendimento, a 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho proibiu uma construtora de Aracaju de promover demissão coletiva sem negociar previamente com o sindicato da categoria.

Em junho de 2017, a empresa dispensou mais de cem trabalhadores sem negociação prévia com o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Pesada, Portos, Aeroportos, Barragens, Canais, Dutos, Eclusas, Estradas, Ferrovias, Hidrelétricas, Metrôs, Pavimentação e Terraplenagem do Estado de Sergipe (Sintepav-SE).

A situação levou o Ministério Público do Trabalho (MPT) a ajuizar ação civil pública para impedir a dispensa e prevenir futuras medidas semelhantes sem discussão dos critérios e das formas com o sindicato.

A empresa, em sua defesa, sustentou que as dispensas são legalmente permitidas e poderiam ser questionadas individualmente na Justiça pelos trabalhadores envolvidos.

O juízo da 9ª Vara do Trabalho de Aracaju deferiu os pedidos do MPT, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 20ª Região (SE) afastou as obrigações impostas à empresa. Para a corte regional, o artigo 477-A da CLT, introduzido pela reforma trabalhista (Lei 13.467/2017), diz que são lícitas as dispensas imotivadas individuais e coletivas, mesmo sem prévia autorização da entidade sindical ou previsão em acordo ou convenção coletiva de trabalho.

Diálogo prévio

Ao examinar o recurso de revista do MPT, o ministro Alberto Balazeiro destacou que, conforme tese de repercussão geral (Tema 638) fixada pelo STF, “a intervenção sindical prévia é exigência procedimental imprescindível para a dispensa em massa de trabalhadores”. Segundo o magistrado, apesar de a dispensa coletiva não estar condicionada à autorização prévia do sindicato, “a existência de um diálogo prévio, leal e efetivo entre o empregador e a categoria é requisito imperativo de validade“.

Além de vedar a dispensa, o colegiado, por unanimidade, impôs multa diária de R$ 10 mil por trabalhador a cada constatação de descumprimento. Com informações da assessoria de imprensa do TST.

Clique aqui para ler o acórdão
RR 487-33.2018.5.20.0009

https://www.conjur.com.br/2024-jan-26/dispensa-em-massa-sem-negociacao-com-sindicato-e-inadmissivel-reforca-tst/

 

29/01/2024

Processo com pedidos que já foram objeto de acordo é extinto

O ajuste feito em comissão de conciliação prévia estabeleceu a quitação plena dos direitos e dos valores descritos

A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho extinguiu o processo em que um técnico em eletricidade pedia créditos trabalhistas que já tinham sido acertados com a ETE Engenharia de Telecomunicações e Eletricidade Ltda. em acordo firmado na Comissão de Conciliação Prévia  (CCP) que previa quitação geral sobre os direitos e os valores descritos no documento. Segundo o colegiado,  o caso tem uma peculiaridade: as verbas deferidas são idênticas às constantes do termo de conciliação.

Acordo

Pelo acordo, firmado para encerrar relação de emprego, o técnico receberia R$ 3.200 a título de equiparação salarial, horas extras, vale-alimentação, diferenças de produção e de adicional de periculosidade e aluguel de celular. Com a alegação de que teria sido coagido a assinar o termo, o profissional pediu, na reclamação trabalhista, os mesmos créditos que tinham sido objeto do acordo.

A ETE, em sua defesa, sustentou que não houve vício de vontade na realização do acordo e que os direitos ajustados não poderiam ser pedidos na Justiça, porque o documento dava plena quitação dos valores e das parcelas.

Abrangência

O juízo da 2ª Vara do Trabalho de Bagé (RS)  extinguiu o processo, e o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) manteve a sentença, por não identificar coação. Para o TRT, o termo de conciliação firmado perante a Comissão de Conciliação Prévia abrange apenas os valores objeto da conciliação, e não as parcelas. Por isso, o trabalhador poderia entrar com a ação para pedir diferenças que considere devidas, abatendo-se posteriormente os valores recebidos sob os mesmos títulos.

Peculiaridade

O ministro Augusto César, relator do recurso da ETE, explicou que o Supremo Tribunal Federal adotou o entendimento de que a eficácia liberatória geral dos acordos em CCP diz respeito às parcelas e aos respectivos valores discutidos no procedimento conciliatório e não implicam quitação geral e indiscriminada de verbas trabalhistas. Com isso, a jurisprudência do TST foi atualizada no mesmo sentido.

Contudo, uma peculiaridade do caso afasta a aplicação dessa regra geral: as verbas deferidas pelo TRT são idênticas às constantes do termo de conciliação, em que houve registro expresso de quitação plena.

A decisão foi unânime.

https://www.tst.jus.br/-/processo-com-pedidos-que-j%C3%A1-foram-objeto-de-acordo-%C3%A9-extinto

 

TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 1ª REGIÃO (TRF-1)

02/01/2024

Justiça determina que rede de supermercados cumpra carga horária dos comerciários

Empregadores precisam respeitar a regra da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que prevê que o intervalo intrajornada não deve ser computado na prática jornada 12×36.

Com essa fundamentação, a juíza Carolina Ferreira Trevizani do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ), determinou que uma rede de mercados da Zona Sul carioca cumpra a regra da escala 12 x 36 para seus funcionários. A rede exigia 12 horas de trabalho ininterruptas, sem considerar a hora de descanso de seus funcionários, o que é proibido pela convenção coletiva da categoria.

A ação foi movida pelo Sindicato dos Empregados no Comércio do Rio de Janeiro. A decisão, reconhece a legitimidade ativa do sindicato para postular em defesa dos interesses dos trabalhadores, ressaltando que a categoria pode ser representada mesmo sem a necessidade de prévia autorização dos substituídos, o que foi deslegitimado pela defesa do supermercado.

O processo teve como foco a exigência, por parte da empresa, de uma jornada de trabalho de 12 horas diárias com apenas 1 hora de intervalo intrajornada, totalizando 13 horas de disponibilidade por dia.

O Ministério Público do Trabalho endossou a tese do sindicato, afirmando que a empresa não comprovou a concessão regular do intervalo. A decisão da juíza determina que a empresa se abstenha de violar o intervalo de descanso de 36 horas, sob pena de multa, e a pagar horas extras pela supressão desse intervalo, acrescidas do adicional devido.

Os advogados que representaram os funcionários foram: Beatriz Pereira Santos; Eduardo Valenca Freitas; Henrique Figueiredo de Lima e Felipe de Santa Cruz Oliveira Scaletsky.

Clique aqui para ler a decisão
Processo 0100861-21.2022.5.01.0082

https://www.conjur.com.br/2024-jan-02/justica-determina-que-rede-de-supermercados-cumpra-carga-horaria-dos-comerciarios/

TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO (TRT-2)

11/01/2024

Trabalhador com filho autista tem jornada reduzida em 50%

A lei não exige que o pai ou a mãe seja solo para ter direito à jornada reduzida para acompanhar filho com transtorno do espectro autista (TEA) em consultas e tratamentos médicos. Além disso, não há qualquer restrição para os pais de filhos com deficiência.

Com esse entendimento, a 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (Grande São Paulo e litoral paulista) determinou que a Fundação Casa de São Paulo reduza em 50% a jornada de um trabalhador, sem prejuízo da remuneração, nem necessidade de compensação, para que possa ser acompanhante do filho, que é portador de TEA. A medida vale enquanto comprovada a necessidade, exigindo-se apenas prova de vida anual da criança.

A decisão modificou sentença de primeira instância que indeferiu o pedido com base no princípio da legalidade, previsto no Direito Administrativo, concluindo que não havia base legal para autorizar a diminuição das horas de trabalho. A negativa também se deu com a alegação de que não se trata de pai solo, que a escala 2 x 2 do homem permitia tais cuidados com o filho e que os acompanhamentos feitos não provocaram sanções administrativas ao profissional.

No entanto, segundo a juíza-relatora do acórdão, Eliane Aparecida da Silva Pedroso, o caso envolve também epilepsias fármaco-resistentes e é complexo o suficiente para que a análise considere as convenções internacionais ratificadas pelo Brasil (como a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência), a Constituição da República e as leis ordinárias, hierarquicamente. Ela citou, por fim, jurisprudência recente envolvendo o tema.

A magistrada sustentou que a lei não obriga que a jornada diária seja de oito horas, nem condiciona o deferimento da redução à probabilidade ou não de punições administrativas.

“A lei não faz nenhuma restrição para os pais de filhos com deficiência e, onde a lei não distingue, não cabe ao intérprete fazê-lo, muito menos para adotar entendimento que acabe por prejudicar aquele a quem o preceito visa a proteger”, afirma a julgadora.

Caso a empresa descumpra o determinado, pagará multa diária de R$ 1 mil, a ser revertida em favor de entidades de amparo a crianças com transtorno do espectro autista. Com informações da assessoria de imprensa do TRT-2.

https://www.conjur.com.br/2024-jan-11/trabalhador-com-filho-autista-tem-jornada-reduzida-em-50/

18/01/2024

Empresa de ônibus deve incluir cobradores e motoristas no cálculo de aprendizes

O empregado aprendiz não é necessariamente uma pessoa que esteja na menoridade civil. Além disso, as regras que instituem as cotas de aprendizes não podem ser negociadas.

Com base nesse entendimento, a 12ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (Grande São Paulo e litoral paulista) manteve a sentença que obrigou uma empresa de transporte urbano a cumprir a cota mínima legal de contratação de aprendizes considerando no cálculo as funções de motorista e cobrador de ônibus.

A ação civil pública proposta pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) denunciou desrespeito pela empresa ao artigo 429 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que dispõe sobre a contratação de pelo menos 5% de aprendizes. Segundo perito do MPT, que observou também a Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), a companhia deveria ter 172 empregados em condição de aprendizagem. Ao não computar os motoristas e os cobradores, apresentava apenas 44 trabalhadores nessa condição.

No recurso, a empresa alegou estar em consonância com a convenção coletiva de trabalho da categoria profissional. Ela afirmou que a exclusão da base de cálculo da função de cobrador ocorreu pela atividade ser classificada como perigosa, e que a de motorista requer capacitação específica, a qual o menor de idade não poderia ter.

No entanto, o desembargador-relator Benedito Valentini ressaltou no acórdão que qualquer atividade que conste na CBO deve ser considerada no cálculo. Ele salientou que o artigo 428 da CLT não limita a empresa à contratação de menores de idade, podendo haver aprendizes também entre 18 e 24 anos.

“O empregado aprendiz não é, necessariamente, pessoa que esteja na menoridade civil e/ou impossibilitada de exercer as funções destinadas exclusivamente às pessoas maiores de idade”, pontuou o magistrado.

Ele destacou ainda que ambas as funções excluídas não se encontram entre as exceções previstas no Decreto 9.579/2018, que consolida normas do Poder Executivo sobre temas relativos à criança e ao adolescente. E citou também jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho relativa a cálculo para contratação de aprendizes nesta e em outras categorias profissionais.

Por fim, amparado na Constituição Federal e na CLT, o relator afirmou que a profissionalização de adolescentes e jovens não pode ser flexibilizada por meio de negociação coletiva. “As regras que instituem as cotas de aprendizes são normas cogentes, de indisponibilidade absoluta, não podendo ser negociadas, até porque constituem instrumentos efetivos para a implementação das políticas públicas da República Federativa do Brasil.”

A decisão de segundo grau reforça o prazo de 120 dias para o cumprimento da medida, sob pena de multa diária de R$ 10 mil, até o limite de R$ 500 mil. Com informações da assessoria de imprensa do TRT-2.

Processo 1000925-80.2021.5.02.0383

https://www.conjur.com.br/2024-jan-18/empresa-de-onibus-deve-incluir-cobradores-e-motoristas-no-calculo-de-aprendizes/

 

TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 12ª REGIÃO (TRT-12)

29/01/2024

TRT-12 confirma decisão que garantiu jornada reduzida a mãe de criança com deficiência

A 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (antiga 6ª Câmara do TRT-12) manteve uma decisão de primeiro grau que reduziu em duas horas diárias, sem necessidade de compensação, a jornada de uma empregada da Caixa Econômica Federal cujo filho tem síndrome de Down e transtorno do espectro autista.

O caso aconteceu em Florianópolis (SC). Ao procurar a Justiça do Trabalho, a mulher alegou dificuldades em acompanhar os diversos tratamentos necessários para o desenvolvimento do filho de quatro anos, devido à jornada de seis horas diárias. Em defesa, a ré alegou inexistência de previsão legal para o pedido, já que o contrato de emprego da funcionária é regido pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Direito por analogia

A magistrada responsável pelo caso na 1ª Vara do Trabalho de Florianópolis, Zelaide de Souza Philippi, considerou o pedido da autora procedente. Na decisão, a juíza observou que os laudos médicos apresentados comprovaram a necessidade de diversos tratamentos para estimular o desenvolvimento social e comunicativo do filho, “além de melhorar seu acesso a oportunidades e experiências do cotidiano”.

Ela ressaltou que, embora a CLT não traga disposição expressa sobre a redução da jornada nessas situações, o artigo 8º da referida legislação permite utilizar o “direito por analogia”.

Com base nisso, a juíza aplicou as disposições do Estatuto do Servidor Público Federal (Lei nº 8.112/90, parágrafos 3º e 4º do art. 98), que possibilita a redução da carga horária sem prejuízo salarial, enquanto perdurar a necessidade de tratamento do filho com deficiência.

Contradição de postura


Inconformada com a decisão inicial, a Caixa recorreu, argumentando a inaplicabilidade da Lei nº 8.112/90 ao caso. A defesa enfatizou que a empregada não é uma servidora estatutária, além de sustentar que a legislação trabalhista vigente abordaria sim, de forma adequada, a situação em análise.

O desembargador Roberto Basilone Leite, relator do acórdão na 2ª Turma do TRT-SC, não concordou com os argumentos do banco. Ele destacou que a Lei do “Programa Emprega + Mulheres”  (14.457/22), mencionada pela defesa, não se aplicava ao caso, pois serve principalmente como orientação interna para o empregador.

Basilone ainda destacou uma contradição na postura da CEF. Isso porque, apesar de defender a sua aplicação no recurso, a empresa não adotou a referida lei quando a trabalhadora solicitou inicialmente o teletrabalho para conciliar as necessidades de tratamento do filho com sua jornada laboral.

Equivalência fática


Quanto ao aplicar analogamente o Estatuto do Servidor Federal, o relator ressaltou a equivalência fática entre relações celetistas e estatutárias.

De acordo com Basilone, tanto empregados regidos pela CLT quanto servidores estatutários desempenham suas funções com pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação jurídica. Ele enfatizou ainda que a concessão de horário diferenciado, como no caso da funcionária da Caixa, se fundamenta na promoção da dignidade da pessoa humana e na necessidade de tratamentos especiais para o desenvolvimento de habilidades e talentos.

“Nem se fale, como pretende a reclamada, em violação ao princípio da legalidade, uma vez que, conforme supra demonstrado, há farta fundamentação jurídica para embasar a procedência da demanda”, concluiu o relator. Com informações da assessoria de comunicação do TRT-12.

Processo 0000138-03.2023.5.12.0001

https://www.conjur.com.br/2024-jan-29/trt-12-confirma-decisao-que-garantiu-jornada-reduzida-a-mae-de-crianca-com-deficiencia/

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO (TJRJ)

23/01/2024

Uber é condenada a indenizar passageiro assaltado em local perigoso do Rio

A natureza da relação de trabalho entre os motoristas e a Uber não afasta a responsabilidade da empresa sobre o serviço prestado, já que ela atua na captação dos clientes.

Esse foi o entendimento utilizado pelo juiz Raphael Azeredo Silva, do 17º Juizado Especial Cível da Regional de Bangu, na cidade do Rio de Janeiro, para condenar a plataforma a pagar R$ 5 mil de indenização a um cliente que foi assaltado após um motorista entrar em uma região perigosa da capital fluminense.

O autor da ação contou nos autos que pediu um carro por meio do aplicativo para ir para casa. No trajeto, ignorando os pedidos do passageiro para retornar, o motorista entrou em uma região perigosa da cidade, afirmando que estava acostumado a dirigir naquele local.

Momentos depois, dois homens armados praticaram o assalto, levando o carro e todos os pertences do motorista e do passageiro.

A Uber pediu a improcedência da ação alegando que não era responsável pelo ocorrido e também a inexistência de danos morais.

Ao analisar o caso, porém, o juiz entendeu que a plataforma tem responsabilidade pelo ocorrido. “Em relação às premissas que afastam a responsabilidade da ré, estas não merecem prosperar. É cediço que o assalto em questão se trata de fortuito externo, porém a questão em voga repousa sobre a atitude do motorista em continuar o trajeto em uma área de alta periculosidade. Aqui, discute-se o risco assumido pelo motorista parceiro da empresa ré em adentrar tal localidade em horário nada propício. Ônus impugnativo não apresentado pela ré (art. 341 CPC).”

O juiz também afastou a alegação de inexistência de dano moral, já que ficou evidente que o passageiro viveu momentos de angústia pelo fato de o motorista ter decidido se aventurar em uma localidade notoriamente insegura.

Por fim, o julgador negou o pedido de ressarcimento do telefone do passageiro pela ausência de estimativa do valor do bem. O autor da ação foi representado pelos advogados Marcus Vinicius de Menezes Reis e Nathalia Soares Sessim.

Clique aqui para ler decisão
Processo 0814291-68.2022.8.19.0204

https://www.conjur.com.br/2024-jan-23/uber-e-condenada-a-indenizar-passageiro-assaltado-em-local-perigoso-do-rio/

 

26/01/2024

Juíza inova ao mandar redes sociais fazerem busca para excluir conteúdo

Em decisão que contraria e abre exceção ao disposto no Marco Civil da Internet, a juíza Fabelisa Gomes Leal, da 3ª Vara Cível da Regional de Campo Grande (RJ), determinou, em sede de tutela provisória, que as redes sociais X (antigo Twitter), Facebook e TikTok removam, por meio de busca ativa com o uso de seus algoritmos, conteúdo que expõe uma pessoa menor de idade vítima de crime violento.

A decisão bate de frente com o que diz a norma brasileira e a própria jurisprudência, que, em geral, exige que a parte ofendida indique expressamente qual conteúdo deve ser removido, e que esse movimento de exclusão de conteúdo não pode ser feito de forma unilateral pelas empresas de tecnologia. A sentença da juíza do Rio fomenta a discussão sobre a necessidade de formulação de uma lei sobre a atuação das redes sociais, que permanecem sem regulamentação específica no Brasil.

Hoje, pelo que é disposto no Marco Civil, as plataformas não podem ser responsabilizadas pelos conteúdos postados por terceiros, à exceção dos casos em que haja descumprimento de decisão judicial para remoção de publicações. A norma, no entanto, resultou em inúmeros casos de descumprimento de sentenças por parte das redes sociais, incluindo em situações que envolvem estupro e pedofilia.

A ação foi impetrada em 2022 e corre sob segredo de Justiça. No processo, é relatado que inúmeras denúncias foram feitas nos canais de atendimento das empresas, que negaram todos os pedidos para remoção do conteúdo. O TikTok, por exemplo, chegou a ser acionado pelo seu canal específico que trata de violações de segurança e crimes envolvendo menores de idade, mas disse que o conteúdo não infringia as diretrizes da empresa.

A advogada da vítima, Gabriella Ventura, então, pediu, por meio de tutela de urgência, a remoção de 30 URLs que continham as imagens expondo o menor. A inicial também pediu que “as plataformas fossem obrigadas a viabilizar, pelos meios tecnológicos e algorítmicos que possuem, a localização ativa de conteúdo idêntico ao indicado na petição e excluir independentemente de nova provocação”.

Em um primeiro momento, a juíza de primeiro grau só atendeu à demanda parcialmente, ordenando a exclusão dos links. Provocada novamente pela omissão em relação ao segundo ponto, a juíza determinou a “localização ativa” das empresas controladoras das redes sociais, utilizando seus próprios meios tecnológicos, para remover os conteúdos, sob pena de multa de R$ 500 por dia de descumprimento.

O Ministério Público se posicionou a favor do pedido da vítima. Disse a juíza na decisão, em 16 de novembro de 2023: “Defiro a tutela provisória determinando que os réus procedam à retirada de imagens da autora veiculados nas redes sociais que a exponha de maneira indevida e não autorizada, desde que relacionada ao evento narrado na inicial, devendo os réus se servirem dos meios tecnológicos ao seu alcance para promoverem a localização ativa desses conteúdos através dos mecanismos de busca.”

O TikTok chegou a recorrer da decisão, alegando que o Marco Civil estipula que a remoção de conteúdo deve ser determinada por decisão judicial específica, com a apresentação do link do post a ser excluído.

No entanto, a desembargadora Marília de Castro Neves Vieira, em 7 de dezembro, negou o pedido de efeito suspensivo e manteve a decisão que determina a busca ativa. Não há data para o julgamento colegiado em segundo grau, pois o recurso que se encontra na fase de apresentação das contrarrazões.

“Ressalte-se ainda que, quando desejado pela agravante, esta consegue identificar postagens de conteúdo indesejado, contudo, no caso em comento, afirma sua impossibilidade. É certo não ser impossível à agravante promover a exclusão de conteúdo relacionado a agravada que ‘exponha de maneira indevida e não autorizada, desde que relacionada ao evento narrado na inicial’”, afirmou Marília Vieira.

“A evolução tecnológica exige uma interpretação da legislação que não privilegie as big techs em detrimento dos direitos dos cidadãos. O mundo todo atualmente discute a responsabilidade de plataformas de tecnologia. Precisamos refletir sobre o impacto social das redes sociais e a urgência de proteger os direitos fundamentais no âmbito digital. Uma moderação eficaz de conteúdo nocivo ou ilegal é possível, não é difícil e essas plataformas devem fazer”, diz Ventura à reportagem.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO (TJSP)

 

06/01/2024

Plano de saúde deve autorizar portabilidade sem cumprimento da carência

A tutela provisória de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

Considerando o que consta no artigo 300 do Código de Processo Civil, o desembargador José Carlos Ferreira Alves, do Tribunal de Justiça de São Paulo, concedeu tutela de urgência para determinar que um plano de saúde regularize o contrato de uma família e autorize portabilidade sem cumprimento do período de carências.

Segundo constam nos autos, a família fez contrato com a Allianz Saúde para a cobertura de seis vidas e foi surpreendida com notificação de que a operadora encerraria suas atividades em janeiro de 2024. Uma das integrantes da família está, hoje, em tratamento médico devido à fratura no ombro direito.

Ao contratar nova operadora, a família pediu liminar para conseguir a dispensa do período de carência.

O desembargador concedeu tutela provisória de urgência, argumentando que a probabilidade do direito está embasada na Resolução 438 de 2018 da ANS, que dispõe sobre a possibilidade de portabilidade especial de carências na hipótese de cancelamento do registro da operadora do plano de origem.

Já o perigo de dano, argumenta, está embasado na iminência de os beneficiários vinculados ao contrato de saúde ficarem sem cobertura médica. O magistrado considera, em especial, o tratamento médico em andamento de um dos membros da família.

“Ademais, observa-se que não há perigo de irreversibilidade da medida deferida neste momento, vez que a agravante deverá adimplir com o pagamento integral dos prêmios”, completou o desembargador.

A família foi representada pelo advogado Davi Teles Marçal.

Processo 2351178-75.2023.8.26.0000
Clique aqui para ler a decisão

https://www.conjur.com.br/2024-jan-06/plano-de-saude-deve-autorizar-portabilidade-sem-cumprimento-da-carencia/

18/01/2024

Operadora de saúde não pode negar tratamento fora do rol da ANS

É abusivo negar cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde (ANS).

Com essa fundamentação, baseada na Súmula 102 do Tribunal de Justiça de São Paulo, o juiz José Augusto Nardy Marzagao, da 4ª vara cível de Atibaia (SP), decidiu que é obrigação de uma operadora de saúde custear terapia especializada para criança com autismo.

O menor de idade foi diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e lhe foi recomendado, pela médica responsável por seu tratamento, terapia ocupacional com abordagem em integração sensorial. Apesar disso, ele não foi atendido pelo convênio.

O juiz explica que, nesse contexto, a ausência de profissionais credenciados pela operadora de assistência à saúde na área do tratamento demandado pela criança impõe para o réu o custeio integral da terapia.

Ainda, a determinação diz que não é lícita a operadora de saúde impor ao autor que se desloque para outro município para ter acesso à prestação de serviço que contratou, dada a flagrante abusividade conflagrada pela desvantagem excessiva imposta ao consumidor.

Assim, a sentença ordena o custeio integral de duas horas semanais do tratamento sob pena de multa diária de R$500, caso a decisão não seja cumprida. O cliente foi assessorado pelo advogado Cléber Stevens Gerage.

Clique aqui para ler a decisão
Processo 1000168-98.2024.8.26.0048

https://www.conjur.com.br/2024-jan-18/operadora-de-saude-nao-pode-negar-tratamento-fora-do-rol-da-ans/

 

21/01/2024

 

TJ-SP mantém decisão que condenou operadoras por portabilidade indevida

Não é responsabilidade do consumidor identificar a autoria da falha na prestação de serviço, já que nas relações de consumo, todas as empresas que atuam em uma cadeia de fornecimento respondem por erros de maneira solidária.

Esse foi o entendimento do juízo da 36ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo para manter decisão que condenou duas operadoras de telefonia por transferência irregular de linha telefônica.

No caso concreto, o autor teve sua linha da Vivo transferida para a operadora Claro sem o seu conhecimento e acabou vítima de um golpe que transferiu pouco mais de R$ 14 mil de uma das suas contas bancárias.

Em sua defesa, a Vivo afirmou que não tem autonomia para recusar pedido de transferência de linha telefônica. A Claro, por sua vez, alegou que não havia nexo de causalidade entre os fatos narrados pelo autor da ação e sua conduta.

Ao analisar o caso, o relator, desembargador Pedro Baccarat, afirmou que a relação do autor com as empresas é de consumo e, portanto, resulta na responsabilidade solidária das duas companhias.

“Da transferência de linhas telefônicas participam as empresas de origem e de destino e não se pode imputar ao consumidor o dever de identificar a autoria da falha na prestação do serviço, impondo-se, antes a fixação da responsabilidade solidária dos fornecedores que participam da prestação do serviço, nela incluída o serviço que assegura a portabilidade das linhas”, registrou.

O julgador explicou que é responsabilidade das empresas zelar pela exatidão dos dados cadastrais daqueles com quem negocia e que o acesso indevido da conta bancária do autor gera dano moral. Diante disso, ele votou pela condenação das empresas a ressarcir o valor retirado da conta do autor e a pagar R$ 8 mil a título de danos morais.

O autor do processo foi representado pelo advogado Raylson Costa de Sousa e Renan de Souza Almeida.

Clique aqui para ler a decisão
Processo 1000854-69.2022.8.26.0595

https://www.conjur.com.br/2024-jan-21/tj-sp-mantem-decisao-que-condenou-operadoras-por-portabilidade-indevida/

 

24/01/ 2024

Hospital não tem direito de recusar procedimento por objeção de consciência

O Hospital São Camilo, de São Paulo, recentemente se negou a implantar em uma paciente um dispositivo intrauterino (DIU), usado como método contraceptivo. Essa é uma diretriz do hospital, ligada aos valores religiosos da instituição, que é confessional católica. No entanto, especialistas em Direito Médico e Bioética afirmam que uma pessoa jurídica não tem direito à objeção de consciência e que condutas desse tipo podem violar a autonomia médica.

O São Camilo informou, em nota pública, que não faz procedimentos contraceptivos — em mulheres ou homens. Por isso, orientou a paciente a buscar outro prestador de serviço dentro da rede credenciada do plano de saúde.

O hospital informou que só autorizaria a inserção do DIU em casos graves de saúde, como endometriose.

A rede São Camilo da cidade de São Paulo subsidia outras unidades pelo Brasil que atendem pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS), embora os hospitais da própria rede não atenda por meio do SUS.

Questão de consciência
Luciana Dadalto, advogada especialista em Direito Médico e bioeticista, destaca que, no Brasil, não existe norma expecífica sobre objeção de consciência institucional.

A Constituição traz o direito à objeção de consciência, mas apenas para pessoas naturais (não para as pessoas jurídicas). Isso também está previsto no Código de Ética Médica (CEM). Luciana explica que o código é voltado aos profissionais, ou seja, não regula a atuação das instituições.

Para ela, a “inexistência de norma específica que dê às instituições de saúde o direito à objeção de consciência” torna a normativa do hospital inconstitucional.

Segundo a advogada, também deve ser levado em conta que a situação viola os direitos de saúde da mulher e o direito constitucional ao planejamento familiar.

Marinella Afonso de Almeida, sócia do escritório Marzagão e Balaró Advogados e especialista em Direito Médico, ressalta que “um hospital privado não é um indivíduo, mas, sim, um prestador de serviço de saúde que deve assegurar o direito social a que se propõe” — afinal, “a saúde é direito de natureza social”.

Por isso, se a negativa é “baseada na institucionalização de um direito individual, pautado em crença religiosa”, tal conduta confronta “de forma direta a autonomia profissional do médico que atua em suas dependências”.

Segundo ela, a diretriz institucional que impede os médicos de fazer procedimentos contraceptivos por motivos religiosos pode configurar infração ao artigo 47 do Código de Ética Médica.

Esse dispositivo proíbe o médico de usar sua posição hierárquica para impedir, por motivo de crença religiosa, “que as instalações e os demais recursos da instituição sob sua direção sejam utilizados por outros médicos”.

Além disso, o artigo 20 do CEM prevê que o médico não pode permitir a interferência de interesses religiosos de seu empregador ou superior “na escolha dos melhores meios de prevenção, diagnóstico ou tratamento disponíveis e cientificamente reconhecidos no interesse da saúde do paciente ou da sociedade”.

Com relação à paciente, Marinella acredita que a negativa do método contraceptivo pode caracterizar “uma sobreposição do interesse particular da instituição de saúde ao direito à saúde e, ainda, um possível atendimento discriminatório”.

Tertius Rebelo, especialista em Direito Médico e da Saúde e membro consultor da Comissão Especial de Direito da Saúde da OAB Nacional, tem opinião semelhante.

Segundo ele, “a recusa de um procedimento médico baseada em valores religiosos da instituição pode ser interpretada como uma violação dos direitos do paciente, especialmente se essa recusa limitar o acesso a serviços de saúde essenciais”.

Rebelo também se baseia na ideia de que a objeção de consciência “é um direito individual do médico” e “não se estende automaticamente às instituições de saúde”.

Ele diz que hospitais e clínicas têm a responsabilidade de garantir a disponibilidade dos serviços necessários para os pacientes, “independentemente das convicções pessoais dos médicos que nelas trabalham”.

Autonomia dos profissionais
Como explica o advogado, a autonomia médica “está intrinsecamente ligada à capacidade do médico de tomar decisões baseadas em evidências científicas, livre de pressões externas, sejam elas institucionais ou religiosas”.

Assim, a imposição de crenças religiosas viola essa autonomia e limita a liberdade do médico “de exercer seu julgamento profissional e de oferecer os melhores cuidados possíveis aos seus pacientes”.

Condutas do tipo também ameaçam “a equidade e o respeito à diversidade cultural e religiosa dos pacientes”. Rebelo destaca que o respeito à autonomia profissional e à diversidade de crenças “é essencial para manter a integridade e a confiança na Medicina”.

De acordo com Henderson Fürst, presidente da Comissão de Bioética da OAB-SP, “quando uma instituição de saúde impede que seus médicos possam atuar conforme os melhores preceitos da ciência médica, restringindo o ato médico por motivos confessionais, há claro desrespeito ao Código de Ética Médica”.

Na sua visão, “não se trata da objeção de consciência do profissional, mas, sim, uma restrição institucional que fere a autonomia médica”.

Fürst ressalta que o direito à saúde também inclui o direito ao planejamento familiar, previsto na Constituição. A Lei do Planejamento Familiar prevê que as ações de planejamento devem ser exercidas pelas instituições públicas e privadas, filantrópicas ou não.

Segundo o advogado, mesmo que seja confessional, o hospital não pode restringir a aplicação de qualquer técnica que viabilize os direitos fundamentais à saúde e ao planejamento familiar.

Autonomia da instituição
Enquanto Luciana Dadalto diz que a rede também está sujeita às normas do sistema público se promove atendimentos via SUS, a advogada e professora Fernanda Schaefer, pós-doutora em Bioética, considera necessário entender o contexto da relação jurídica para analisar a validade da negativa.

De acordo com ela, se o procedimento for solicitado via SUS, “é preciso analisar se há contratualização do hospital para o procedimento”.

Se sim, “não pode haver recusa”, conforme as diretrizes estabelecidas pelo Ministério da Saúde. Se não, “a recusa estaria justificada por ausência de contratação do serviço”.

Se o atendimento for particular, é preciso verificar se o contrato do usuário possui cobertura para o procedimento, se há liberação do plano. Também é necessário entender “quem prescreveu o dispositivo e por que ele procurou esse hospital”.

Outra medida importante é averiguar se há outros hospitais ou prestadores na rede. Em caso positivo, basta que o plano encaminhe a eles. Em caso negativo, “o plano deve custear fora da rede, se preenchidos os requisitos da modalidade contratual dela e do rol da ANS”.

Em resumo, Fernanda acredita que, “não sendo situação de urgência e emergência e não sendo procedimento contratualizado pelo SUS, o hospital tem autonomia para determinar quais procedimentos realiza ou não, de acordo com sua missão e seus valores”.

Ela ressalta que os médicos podem recusar tratamentos por objeção de consciência, conforme resolução do Conselho Federal de Medicina. Mas “instituições (sejam públicas ou privadas) não teriam como invocar esse argumento”.

Apesar da polêmica causada nas redes sociais sobre o tema, Mérces da Silva Nunes, especialista em Direito Médico e Bioética, também entende que o hospital privado pode se negar a fazer um procedimento por preceitos religiosos se não houver risco à integridade da saúde do paciente.

“A negativa não ofende o Direito Médico, nem os princípios da Bioética, como não maleficência, beneficência, justiça e autonomia”, explica a advogada. Ela também não vê a conduta como discriminatória, já que o São Camilo também não promove vasectomia em homens.

Segundo Mérces, o hospital poderia responder criminalmente pela negativa de um procedimento, mas apenas em caso de risco de vida para o paciente, em uma situação de emergência.

Para ela, o encaminhamento a outro hospital credenciado pelo plano de sáude da paciente é correto. Caso a operadora tenha uma rede própria, “custear as despesas de outro hospital e de prestadores de serviço seria uma alternativa necessária, do ponto de vista contratual e das relações de consumo, já que os planos de saúde não podem recusar cobertura para procedimentos previstos no rol da ANS”.

https://www.conjur.com.br/2024-jan-24/hospital-nao-tem-direito-a-recusar-procedimento-por-objecao-de-consciencia/

 

27/01/2024

Pais com filhos com deficiência podem pedir redução de carga de trabalho

Os servidores públicos da Administração Direta, Indireta, Autárquica ou Fundacional, incluindo os funcionários das fundações mantidas ou instituídas pelo município, que tenham filhos, enteados ou dependentes legais com deficiência congênita ou adquirida, têm direito à redução de sua carga horária de trabalho.

Com esse entendimento, a juíza Sabrina Martinho Soares, da Vara da Fazenda Pública de Limeira (SP), autorizou a redução da jornada de trabalho de uma mãe de criança com autismo e transtorno de personalidade para 22 horas semanais.

Ela é servidora pública municipal e trabalha como merendeira em uma escola desde janeiro de 2023. O filho, de sete anos de idade, precisa de acompanhamento para frequentar diversos tipos de terapia, o que impossibilita que a mãe exerça jornada de trabalho com a carga horária tradicional.

De acordo com a sentença, o número de horas de terapia da criança chega a 18 por semana, além de mais quatro horas e meia de deslocamento. Os horários das terapias são fixos de segunda a sexta feira, das 7h às 10h. Não cumprir todas as horas do tratamento exigido pode acarretar em consequências graves ao menino, diz o processo. Ainda, há a possibilidade da carga ser expandida para até 40 horas.

No entendimento da magistrada, a redução na carga horária de trabalho é uma maneira de garantir os direitos previstos na lei para crianças com deficiência.

“É notório que a criança com necessidades especiais demanda atenção e cuidados a serem prestado por seus familiares, portanto, considerando que seus interesses deverão prevalecer sobre qualquer outro, a limitação sofrida pela autora na plena dispensa dos meios indispensáveis de prestar tal amparo ao filho, viola tanto os interesses como a própria dignidade da criança, principalmente, ao se considerar a tenra idade do infante”, observa a juíza.

A mãe foi patrocinada pelo advogado William Chaves, do escritório Kaio Cesar Pedroso Advocacia.

Processo 1013900-43.2023.8.26.0320
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https://www.conjur.com.br/2024-jan-27/pais-com-filhos-com-deficiencia-podem-pedir-reducao-de-carga-de-trabalho/

 

28/01/024

Juizado reconhece cobrança abusiva feita por operadora de plano de saúde

Os contratos de clientes com operadoras de planos de saúde têm renovação automática a partir do vencimento do prazo inicial de vigência, e não há previsão para cobrança de taxas ou qualquer outro valor no ato da renovação.

Com esse entendimento, o juiz Fernando Bonfietti Izidoro, da Vara do Juizado Especial Cível do Foro de Jundiaí (SP), determinou que uma operadora pare de fazer cobranças indevidas a cliente que atrasou em nove dias o pagamento de uma mensalidade.

Segundo o magistrado, é de conhecimento notório que as grandes operadoras costumam disponibilizar, como formato exclusivo aos consumidores, a adoção da modalidade coletiva, para desvio das normas da Agência Nacional de Saúde (ANS) que tratam de reajustes e garantias contratuais.

“Tal prática enseja riscos de comportamentos abusivos vedados pelo Código de Defesa Civil do Consumidor e também violadores dos princípios da boa-fé objetiva e da função social dos contratos.”

Para ele, houve comprovação do abuso, conforme informações trazidas nos autos, uma vez que a operadora fere o artigo 13 da Lei 9.656/1998, que veda “a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato, salvo por fraude ou não-pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, consecutivos ou não, nos últimos doze meses de vigência do contrato”.

Com isso, o juiz determinou ainda que a operadora não insira dados do cliente em serviços de restrição de crédito. A pena é de multa de R$ 100 por cada cobrança indevida e de R$ 500 para cada protesto realizado.

O cliente do plano de saúde foi representado pelo advogado Rodrigo Diegues Cruz.

Clique aqui para ler o acórdão
Processo 1011487-90.2023.8.26.0309

https://www.conjur.com.br/2024-jan-28/juizado-reconhece-cobranca-abusiva-feita-por-operadora-de-plano-de-saude/

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO MARANHÃO (TJMA)

03/01/2024

 

O descumprimento do contrato de prestação de serviços de saúde afeta o direito imaterial do consumidor, sendo, portanto, uma conduta ilícita e ilegal, devendo o prestador de serviços responder por isso.

Esse foi o entendimento de sentença proferida no 4º Juizado Especial Cível e das Relações de Consumo de São Luís, ao julgar uma ação que teve como ré a Unimed Maranhão do Sul Cooperativa de Trabalho Médico. No processo, o beneficiário alegou ter diagnóstico de transtorno depressivo recorrente, com indicação de tratamento de 20 sessões de eletroconvulsoterapia.

Ao entrar com o pedido de autorização, o autor teria sido informado que a ré não possuía prestadores credenciados para o procedimento. Diante desse cenário, ele solicitou em sede de decisão antecipatória a autorização do procedimento e a indenização a título de danos morais.

Foi concedida a liminar, determinando que o plano de saúde autorizasse e custeasse a realização de tratamento de eletroconvulsoterapia, bem como de eventual tratamento necessário e indicado pela equipe médica. Em defesa, a parte demandada alegou não ter praticado nenhum ato ilícito, pois o referido tratamento não constaria no rol da Agência Nacional de Saúde (ANS), pedindo pela improcedência dos pedidos do autor.

“O contrato de assistência médico-hospitalar traduz verdadeira relação de consumo, o que, por si só, deve ser estudado à luz do Código de Defesa do Consumidor. O referido diploma estabelece, em seu artigo 51, IV, que são nulas as cláusulas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade. A parte firmou contrato de seguro-saúde com a reclamada no afã de se resguardar sobre eventual acidente ou doença por ventura apareça. O descumprimento do contrato de prestação de serviços de saúde afeta o direito imaterial do consumidor, sendo portanto uma conduta ilícita e ilegal, devendo o responsável, o réu, na hipótese, responder objetivamente”, observou o juiz Licar Pereira.

Para a Justiça, é incontestável o estado de saúde do autor e, no momento em que precisou, teve seu tratamento negado.

“Não merece prosperar a negativa da requerida baseada na ausência do procedimento no rol da Agência Nacional de Saúde, pois a taxatividade, para a cobertura de planos de saúde foi derrubada pela Lei n. 14.454, de 21 de setembro de 2022. Assim sendo, a operadora pode restringir as doenças cobertas pelo plano de saúde, porém não pode fazê-lo em relação aos tratamentos a serem ofertados para controle da enfermidade, pois o simples fato de o procedimento solicitado não estar expressamente descrito no rol elaborado pela ANS não é argumento suficiente à negativa do tratamento indicado pelo médico, já que o contrato abrange a doença”, pontuou.

O juiz verificou que houve a comprovação, por parte do demandante, da eficácia do tratamento de eletroconvulsoterapia, tendo o médico responsável reforçado que a indicação do tratamento foi baseada também no esgotamento de terapias mais conservadoras e no risco de piora do paciente, com possibilidade de tentativa de suicídio.

Por isso, confirmou a liminar concedida e condenou o plano a pagar ao autor o valor de R$ 3.000,00, a título de indenização por danos morais.

Processo 0801612-54.2023.8.10.0009

https://www.conjur.com.br/2024-jan-03/operadora-de-plano-de-saude-e-condenada-por-descumprir-contrato/

 

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