EFEITOS DA CRISE DO COVID-19 SOBRE AS OBRIGAÇÕES ASSUMIDAS NOS CONTRATOS ENTRE EMPRESAS E DE CONSUMO

A teoria contratualista defendida pelos Filósofos Thomas Hobbes, John Locke e Jean-Jacques Rousseau, na qual o homem social, que vive em sociedade, fez ao deixar seu estado natural de ser isolado, ou seja, um pacto de convivência social entre os cidadãos para fosse possível viver em sociedade ( embora tenha essa teoria sido criticada por Hegel), se reforça cada vez mais neste momento de crise do COVID-19.

Hobbes, com  seu livro Leviatã, que era uma criatura do imaginário da época em forma de um gigantesco monstro marinho protetor dos peixes e animais marinhos menores, criou uma metáfora do poder e da função do estado, pois defendia Hobbes, a forte concentração do poder estatal.

Já  Locke, fiel defensor da propriedade privada, entendia que o pacto social era necessário para preservar a posse dos bens privados e que o estado deveria obedecer a certos limites, principalmente, no que tange a propriedade privada. Para o filósofo, o estado não deveria ter força extrema mas agir dentro dos limites do direito a  propriedade.

A  lição que  podemos tirar da teoria contratualista em Hobbes e Locke é o que estado, neste momento de crise do COVID-19, precisa atuar fortemente e com extrema força para salvar empregos, vida e garantir o sustento básico das pessoas mais vulneráveis, como por exemplo, trabalhadores informais, empregados com renda inferior a 05 salários mínimos, subsidiar as micro, pequenas e médias empresas, principalmente suas folhas de pagamento e, suspender o pagamento de tributos parcelados, vencidos e a vencer, conceder a suspensão temporária de tributos sobre os insumos dos serviços públicos essenciais e sobre as mercadorias essenciais para tratamento do COVID-19.

Inegavelmente Hobbes estava com razão, é preciso Leviatã mostrar sua força!

Contudo, no se refere a propriedade privada, Locke também tem razão no que tange a intervenção mínima do poder estatal, pois a força obrigatória dos contratos (pacta sunt servanda) e o que fora pactuado de acordo com a autonomia da vontade das partes em uma ambiência de paz social e normalidade, foi complemente alterada pela crise do COVID-19 e a recomendação/determinação de isolamento social. Os decretos de calamidade pública Federal e os decretos de estado de emergência editados pelos estados e municípios já caracterizam a força maior prevista no art. 393 e seu parágrafo único do Código Civil Brasileiro. O isolamento social, necessário ressalte-se, tornou muitas obrigações impossíveis de serem cumpridas e, assim sendo, aplica-se o art. 248 do Código civil.

O pacto social de convivência e boa fé, onde não se permite ninguém lesar ninguém, faz com que as cláusulas penais dos contratos sejam mitigadas neste momento. O que se espera, é que, o seu parceiro contratual, seja leal, compreensivo, compassivo e solidário, pois não pode o contrato, assinado em uma outra ambiência social e negocial, tornar-se uma sentença de morte financeira ou econômica ( aplica-se aqui para a interpretação dos contratos, também para momentos de crise, os incisos III e V do §1° do art. 113 do CCB).

O art. 422 do Código Civil expressa que os parceiros contratuais devem guardar tanto na conclusão como na sua execução, os princípios da probidade e boa-fé.

E não é só!

Embora o art.421-A do CCB expresse que presume-se que os contratos empresariais são paritários e simétricos e que as alocações de riscos neles definidas devem ser respeitadas e preservadas (inciso II do art.421-A), também expressa que a revisão contratual poderá ocorrer de maneira excepcional (inciso III do art. 421-A), justamente o momento em que vivemos da crise do COVID-19.

A redução do valor da parcela ( obrigação de pagar),  tornou-se possível, se extremamente excessiva para a parte com essa obrigação, em razão da perda de receita em virtude do isolamento social e seu efeito cascata. Por certo, os contratos, após firmados, geram expectativa de direito, mas se a obrigação tornou-se impossível de cumprir, aplicam-se os arts. 248 c/c 478 c/c 317 todos  do CCB, mas se ainda há possibilidade de cumprí-la mediante uma redução proporcional aos impactos financeiros sofridos pela parte com obrigação de pagar, aplicam-se os arts. 479 c/c 480 ambos do CCB, por mais específica que seja a lei  de regência do contrato.

Temos também a hipótese do risco  de não cumprimento de uma das partes contratantes na obrigação de dar (entregar) coisa certa por perda considerável em seu patrimônio, neste caso, como efeito colateral do isolamento social, pode a outra parte recusar-se a cumprir com a obrigação que lhe incumbe até que o outro contratante satisfaça a obrigação que lhe compete ou lhe dê garantias (art. 477 do CCB).

Para as pessoas físicas, nas relações de consumo, no que diz respeito ao não cumprimento da obrigação impossível, aplicam-se os arts. 248 c/c 317 c/c 478 do CCB por ser fonte subsidiária do CDC e também em razão da teoria do diálogo das fontes. Porém, há permissivo legal no CDC para a revisão dos contratos das prestações que tornarem-se excessivamente onerosas em razão de fatos supervenientes à conclusão do contrato (inciso V do art. 6° do CDC).

Ademais, as regras de consumo são normas de ordem pública (art. 1° CDC) e sua política tem por objetivo o atendimento as necessidades do consumidor, a proteção de seus interesses econômicos e a melhoria de sua qualidade de vida, entre outros. Para tanto, exige o código consumerista, que haja harmonização  de interesses dos participantes das relações de consumo sempre com base na boa-fé e no equilíbrio nas relações entre fornecedores e consumidores (inciso III do art. 4 do CDC).

Por fim, para os todos os casos onde  sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, por mais específica que seja a lei de regência do contrato, isso em razão de sempre o código civil ser sua fonte subsidiária, ou mesmo em razão da teoria do diálogo das fontes, ou em razão do que expressa o art. 5° da LINDB, que determina que na aplicação da lei o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se destina e ás exigências do bem comum.

 

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